5.6. "Revoltas" no bloco de leste (Jugoslávia, Polónia, Hungria, Checoslováquia) e no bloco de oeste (França, República Federal da Alemanha)
Durante a Guerra Fria, surgem alguns conflitos, quer no bloco de leste quer no bloco ocidental, de países que tentam fugir aos regimes "impostos", quer por Moscovo, quer por Washington, tentando assim não alinhar com nenhuma das super potências.
De 1941 a 1945, exactamente durante a Segunda Guerra Mundial, italianos e alemães ocuparam a Jugoslávia, e Hitler e Mussolini impuseram o seu regime, fazendo com que católicos e muçulmanos ficassem contra os próprios sérvios, judeus e ciganos. Isso resultou em muita matança e muitas atrocidades. Assim surgiram movimentos de resistência, nos quais os partizans - guerrilheiros comunistas de Josip Broz Tito, primeiro-ministro jugoslavo de 1945 a 1953 e presidente de 1953 a 1980, nascido na Croácia - e soldados monárquicos conhecidos como chetniks, lutaram contra a ocupação e conseguiram libertar-se sem a ajuda do Exército Vermelho. Tito fundou a República Socialista Federativa da Jugoslávia, que agrupava seis repúblicas: Sérvia, Croácia, Eslovénia, Bósnia e Herzegovina, Montenegro e Macedónia. Ele criou também um sistema rotativo para o governo, para as repúblicas não ficarem insatisfeitas, que consistia na indicação do presidente a cada período ser feita por cada uma das repúblicas. O regime iugoslavo sob Tito ficou conhecido como titoísmo.
Uma anedota que sintetizava o sistema político-étnico da Jugoslávia sob Tito era: "Seis repúblicas, cinco etnias, quatro línguas, três religiões, dois alfabetos e um Partido".
Tito seguiu uma linha de independência em relação às orientações de Moscovo, enfurecendo a liderança soviética. Em 1948, os dois países romperam oficialmente, a Jugoslávia foi expulsa do Comintern, dando início ao período do Informbiro nos Balcãs. Com a desestalinização, Nikita Khruschov restaurou e normalizou as relações entre os dois países, mas os jugoslavos mantiveram sua autonomia geopolítica. Isso permitiu a Tito liderar o Movimento Não-Alinhado, que se tornou uma força expressiva no Terceiro Mundo da década de 1950 à de 1980.
Tito e seus seguidores eram socialistas, e o sistema político estabelecido no país após a guerra foi o socialismo. Inicialmente a Jugoslávia manteve-se alinhada com a União Soviética de Stalin. Mas já em 1948 Tito afastou-se das diretrizes impostas pela União Soviética e definiu um modelo próprio de socialismo. Uma das características desse modelo era a autogestão das fábricas pelos operários. A partir de 1953 foi autorizada a dissolução das comunas rurais e o ressurgimento da pequena propriedade urbana. Mas o maior mérito do regime chefiado por Tito foi a manutenção da unidade de um país que congregava diversos povos, de culturas e religiões diferentes, alguns inimigos há muitos séculos: sérvios (cristãos ortodoxos), croatas (católicos), eslovenos (católicos), bósnios (muçulmanos), húngaros e albaneses, entre outros. Apesar dessas diferenças, enquanto Tito viveu a Jugoslávia usufruiu de um período de estabilidade política. Quanto à economia, em 1967 foram feitas reformas para alcançar o que era denominado socialismo de mercado. Tratava-se de uma tentativa de combinar a livre iniciativa com alguns princípios socialistas e melhorar o desempenho do setor produtivo. Nessa difícil passagem para a economia de mercado, sobreveio um período de crise, com desemprego, inflação e endividamento externo.
Outro dos países que tentou desafiar a influência soviética foi a Polónia. Sem qualquer tradição comunista, o comunismo na Polónia era imposto pelos tanques do exército russo. Nos anos 50, os polacos apercebem-se que o comunismo afinal não trouxe tudo aquilo que prometera no início e em 1953 dão-se manifestações contra a presença da União Soviética no país. Como resposta, os soviéticos alteram a liderança do Partido Trabalhista polaco e impôem uma mão mais dura no país. Em 1956, dá-se mesmo uma intervenção soviética para que um dos países para lá da Cortina de Ferro não saia da sua influência.
Apenas na década de 80, o Papa João Paulo II apoia as manifestações lideradas por Lech Walesa, um católico devoto e conseguem ambos derrubar o comunismo. Em 1989, a Polónia é o primeiro governo não-comunista do Leste da Europa.
Também na Hungria se deu um conflito que pôs em causa a hegemonia soviética na região. A Hungria era antes um grande império, que foi depois derrubado e entregue à Áustria, formando assim o Império Austro-Húngaro até metade do séc.XIX. Depois da I Guerra Mundial, a República da Hungria conheceu governos de direita pró-fascistas e após a II Guerra Mundial foi ocupada pela URSS. Realizam-se aí eleições e o Exército Vermelho impôe a vitória dos comunistas, facto que causa a revolta dos húngaros.
Em 1952, surge uma linha reformadora no interior do PC- querem reformá-lo do regime soviético, aproximando-o de regimes do Ocidente liberal. Chegam a instituir de volta a propriedade privada, entre outras reformas no sentido do capitalismo. Em 1956, chegam a pedir a Moscovo a independência política e a retirada do Exército Vermelho do país.
É nesse ano que se dá a primeira intervenção militar da URSS na sua zona de controlo: Moscovo ordena o envio de tanques para a Hungria, e como o país é muito plano, os tanques rapidamente avançam e chegam a Budapeste. Aí conhecem resistência dos húngaros e dá-se uma batalha, na capital, entre o Exército Vermelho e o exército húngaro. Fontes do ocidente falam em 2 milhões de mortos e do Leste em 2000 mortos. Após abertos os arquivos oficiais, percebe-se que o número de mortos na batalha de Budapeste se situará perto dos 20.000. Alguns húngaros fugiram para sempre do seu país, entre eles os pais do actual presidente francês, Nicolas Sarkozy. Após a batalha, os russos vencem e instalam no país um novo governo pró-URSS.
Na Checoslováquia dá-se o terceiro conflito deste período. A Checoslováquia é um país nascido do fim do grande Império Austro-Hungaro. Trata-se d eum território muito evoluído tecnologicamente, nomeadamente ao nível da indústria automóvel (cf. Skoda). No pré II guerra, são vendidos pelo Ocidente a Hitler, na base da política de apaziguamento e é o exército Vermelho quem liberta o país, findo o conflito e instala aí um governo pró-russo.
Nos anos 60, surge no país um movimento no seio da comunidade de escritores favoráveis a reformas. Simultaneamente, vence no PC local a linha liberal reformadora, que quer anular a linha conservadora do partido. Começam assim a dar liberdades ao povo, a praticar uma economia de mercado, introduzindo assim praticamente um regime liberal.
Em 1968, Bresnev, secretário geral do PCUS, envia o exército para Praga, para acabar com esta "Primavera de Praga" de reformas liberalistas. A apoiá-lo, todos os regimes comunistas da Europa de Leste menos a Roménia. Dado o carácter pacífico e prático do povo checoslovaco, estes não se sentem capazes de entrar em conflito armado com os exércitos invasores e cedem.
A Checoslováquia só viria a desintegrar-se após a queda do Muro de Berlim, na chamada "Revolução de Veludo", onde não há nenhum conflito armado para derrubar o comunismo e tudo é liderado e conduzido por artistas e escritores.
No Ocidente, também há revoltas, desta vez contra o outro "ocupante", os Estados Unidos da América. O primeiro desse conflito dá-se em França. Charles de Gaulle, um militar oriundo de uma família rica, que participa na I Guerra Mundial, dedica-se após esse conflito a escrever livros e a ser uma espécie de intelectual do exército francês. Porém quando Hitler ocupa a França, retira-se para o Norte de África e regressa depois como libertador do país, impulsionado pelos americanos que são, de facto, os verdadeiros libertadores de França.
A França dos anos 40 e 50 é um país com graves problemas económicos, dividido em vários assuntos, entre os quais a questão das colónias, como o Vietname e a Argélia. Dá-se por esta altura a independência da maior parte das suas colónias, acompanhado pelo crescimento exponencial dos apoiantes do comunismo. Tanto que, a certo ponto, uma guerra civil parecia inevitável. Em 1958 Charles de Gaulle assume o poder e altera as relações no interior do país, refundando a República Francesa e instaurando a V República. Nessa nova França, é introduzido o sistema presidencial, em que o Presidente da República nomeia e destitui o governo. O Presidente da República, em França, é a principal figura no interior e a principal instituição política. Não se trata contudo de um regime totalitário porque há um Parlamento e há constantemente referendos como modo de realizar uma democracia directa.
Charles de Gaulle afirma, no entanto, que caso os EUA não tivessem traído a França e os tivesse apoiado de início na II Guerra, a França poderia ter resistido à invasão Nazi. Por conseguinte, há um sentimento de desconfiança geral em relação à América. Pensa-se antes que a França deve ser forte e investir em tecnologia, armamento, etc. A França, na altura, torna-se o país que contraria tudo o que os EUA fazem, num anti-americanismo galopante. Esta tensão aumenta com a França a dar independência às suas colónias e com a abertura de relações com a URSS. De Gaulle afirma mesmo que se deve quebrar aos poucos a cortina de ferro e conseguir um equilíbrio na Europa.
Tudo isto é permitido pelos EUA porque após a Crise de Cuba a estratégia de ataque norte-americana altera-se: percebem que de repente algo pode correr mal e surge a chamada Doutrina McNamara: a resposta de ataque deve ser gradual, aos poucos, tendo em conta os interesses: “A Melhor Forma de Manter Um Povo Pobre e Subdesenvolvido é Fornecer-lhe Tecnologia Pronta ”. Desta forma, os países mantêm-se sempre dependentes do seu fornecedor e não se desenvolvem.
De Gaulle chega mesmo a visitar Moscovo, investe na Roménia (o grupo Renault é detentor da marca Dacia) e cria grandes tensões na OTAN, retirando-se a partir de 1966: continua a participar politicamente mas não com o exército francês. Esta é uma realidade que ainda hoje se verifica. Dentro da Europa, De Gaulle quer uma Europa europeia e não uma Europa atlântica. Os que proclamam esta última Europa, querem uma Europa intimamente ligada aos EUA. São eles o Reino Unido, Holanda, Noruega, Dinamarca e Portugal, que tem que ter um aliado forte para anular o "eterno inimigo" espanhol. O caso mais flagrante desta Europa atlântica é precisamente português: Durão Barroso fica do lado de Bush na guerra do Iraque e escreve uma carta à Europa chamada "Europa Velha, Europa Nova". Isto rende-lhe a simpatia de Bush que consegue elegê-lo para Presidente do Conselho Europeu.
O outro grande conflito de relações acontece na Alemanha Ocidental. Em 1945, a Alemanha é ocupada e dividida em quatro. Em 1949 os ocidentais proclamam a independência do país e ensaiam o nascimento de um estado novo, a República Federativa Alemã. Este novo país tem um grande handicap: ele não possui armas devido ao acordo pós-guerra e tem um exército pequeno para a altura, de apenas 100 mil homens. Assim, a Alemanha Ocidental passa a utilizar outra arma, o dinheiro. Graças ao Plano Marshall, nos anos 70 a Alemanha Ocidental já é a segunda ou terceira potência a nível mundial.
Numa tentativa de evitar a guerra civil, a Alemanha Ocidental com o Leste, aquela compra a sua segurança. A figura de proa é Willy Brandt, alemão democrata que é um dos fundadores da Alemanha do pós-guerra. Torna-se famoso na Alemanha e no mundo depois da crise de Berlim porque é o presidente da câmara de Berlim Ocidental. Nos anos 60 é um político muito popular e é eleito chanceler da Alemanha. Contudo, uma das suas secretárias é apanhada como espia da Alemanha de Leste e ele vê-se forçado a demitir-se.
Em Portugal, no Porto, existe um busto de Willy Brandt, na Av. Marechal Gomes da Costa. Trata-se de um tributo português feito por Mário Soares pelo facto do alemão ter dado dinheiro a Portugal para a reconstrução pós 25 de Abril. De facto, o que aconteceu foi que Brandt, socialista e amigo de Mário Soares, financiou a sua campanha, impondo assim um caminho democrático em Portugal e evitando a subida dos comunistas.
Willy Brandt fez também uma homenagem sincera aos judeus mortos pelos alemães, pondo-se de joelhos em frente a um monumento erguido em honra daqueles e pedindo um sentido perdão a Deus. Fica conhecido, sobretudo, pela sua Ostpolitik - a política de aproximação ao Leste. Como vimos, Brandt negocia com o Leste, dá-lhes dinheiro e assina um acordo de Paz e não agressão. Assina acordos também com polacos, jugoslavos, checos, etc.
Brandt enfrenta contudo um grave problema: a Constituição da Alemanha Federal não reconhece a existência da Alemanha de Leste, reconhece apenas uma ocupação temporária. Assim sendo, nenhum político pode reconhecer a outra Alemanha e Brandt é forçado a fazer um reconhecimento sem reconhecimento, através de acordos culturais com a Alemanha de Leste mas sempre alegando que, de facto, não existe reconhecimento do outro país.
Tanto se entendem as Alemanhas que a ONU admite-as como dois países diferentes, contrariando as imposições de Washington e no Campeonato Europeu de Futebol as duas participam, por coincidência defrontando-se. Brandt apagou assim um foco de conflito que poderia explodir a qualquer momento, ultrapassando-o. A sua política incentivou vários acordos entre o ocidente europeu e o leste, tanto que em 1975, a Acta Final de Helsínquia reconhece pacificamente todas as fronteiras da Europa. Willy Brandt consegue um degelo e desanuviamento entre as Europas, graças à sua Ostpolitik. É galardoado com o Prémio Nobel da Paz.
Assim, também a Alemanha e a França se afastam do controlo dos EUA, tornando-se o motor da União Europeia, até há pouco tempo. Brandt e De Gaulle estão na origem de um movimento depois liderado por Helmut Kohl e Miterrand.
31/10/08
28/10/08
HMC - Aula 9
V - GUERRA FRIA
5.5. Guerra do Vietname
Durante a Guerra Fria houve várias guerras civis apoiadas pela URSS e pelos EUA, pelo mundo fora. Por exemplo, a guerra civil de Angola, disputada durante anos e anos pelo MPLA, apoiado pela URSS e a Unita, apoiada pelos Estados Unidos. Estas guerras entre duas facções apoiadas pelas duas grandes potências sucederam-se um pouco por todo o mundo.
No Vietname, a história foi parecida mas não exactamente assim. O país foi palco da primeira e única guerra no séc. XX que os Estados Unidos perderam, facto que originou uma grave crise económica subsequente. É possível até criar um paralelismo com a actualidade: também a crise actual é desencadeada por um falhanço militar dos Estados Unidos, neste caso no Iraque. Trata-se de guerras muito caras, que quando falham acabam por arrastar a nação mais poderosa do mundo para a crise, e por conseguinte todo o planeta que dela está dependente.
Quanto ao Vietname, trata-se hoje de um território com cerca de 80 milhões de habitantes, um estado que cresce de forma expoente graças à nova economia de um comunismo do séc. XXI baseado na captação de indústria estrangeira e no turismo. De facto, o Vietname é um território que sempre foi cobiçado pelas potências europeias, desde a altura do colonialismo. Está organizado à volta de dois rios, o Vermelho e o Mecong, o que torna o seu terreno muito fértil, acompanhado de um clima tropical chuvoso que propiciam a produção e colheita de arroz duas ou três vezes por ano.
Assim, na segunda metade do século XIX, a França consegue finalmente controlar aquela zona, a da Indochina, constituída pelo Vietname, Laos, Cambodja e uma parte da Tailândia. Trata-se de uma ocupação mal vista pelos locais, que lutam até 1940 pela independência do território. Nesse ano, Hitler invade a Alemanha e a Indochina passa a ser administrada pelo Japão, aliado nazi. Em 1945, depois de perder a guerra e no seguimento de revoltas antecedentes, o Japão retira-se de vez da Indochina e Churchill pressiona os franceses a reconquistarem o território, de forma a poder contrabalançar o poder soviético na zona, já que a China e a URSS eram aliadas à altura. Porém também no Vietname há movimentos independentistas comunistas que fazem com que caso a França não regresse ao local, o território seja dominado pelos comunistas. Churchill, principal impulsionador da cruzada anti-comunista, empurra a França de novo ao local.
Em 1945 acontece a 1ª guerra do Vietname, opondo as guerrilhas vietnamitas apoiadas pela URSS (Vietmin a Norte e Vietcong a Sul) e a França. Após um sucesso francês inicial, a guerrilha consegue cercar todo o exército quando este se preparava para uma batalha crucial em que eliminariam a guerrilha de vez. O exército francês é assim cercado pela guerrilha, impedindo-o de se abastecer e tendo assim que se render. As negociações pós-guerra duram dois anos e são feitas em Genebra, sede da ONU- é acordado um cessar fogo baseado na divisao do Vietname em duas partes pelo paralelo 17 e são organizadas eleições democráticas.
O Norte e o Sul organizam eleições, nas quais o Norte elege comunistas e o Sul não-comunistas (ditadores nomeados pelos Estados Unidos). Gera-se um clima de tensões e acusações permanentes. E no âmbito da política de contenção do comunismo, os americanos envolvem-se na guerra: Kennedy em 1961 envia conselheiros militares para o Vietname e posteriormente envia armamento e mais "conselheiros". Tanto que, em 1964 os Estados Unidos declaram no Congresso oficialmente aberta a guerra contra o Vietname. Enviam 500 mil soldados para aquilo que chamam de luta pela liberdade, lema com o qual pretendem a adesão dos povos ocidentais.
Porém, a Europa não apoia a ofensiva americana: apenas a Austrália e a Coreia do Sul. Embora se refira por vezes o combate dos vietnamitas do sul contra os do norte, quem combate na realidade são os americanos contra os vietnamitas do norte. Esta facto é tornado mais que evidente na Ofensiva Teth, ocorrida no dia 30 de Janeiro de 1968: aqui, os vietcongs, do sul, preparam uma acção militar e atacam simultaneamente 105 cidades no Sul do Vietname, demonstrando que se trata de uma resistência militar maciça contra os americanos e não de uma luta interna ou de um terrorismo do norte contra o sul.
A ofensiva é de tal ordem que até a Embaixada norte-americana em Shangai é atacada. Esta ofensiva é neutralizada pelos americanos mas a partir daqui percebe-se claramente que não haverá nunca vitória no Vietname. Há-que arranjar uma solução e sair do Vietname, à semelhança do que se procura agora no Iraque. Uma solução que mantenha o orgulho americano intacto: desta forma, são iniciadas as negociações entre o norte e o sul conduzidas por Henry Kissinger.
Henry Kissinger, Prémio Nobel da Paz, foi um judeu que fugiu para os Estados Unidos e fez a sua tese de doutoramento sobre Meterlin, um general austríaco da altura pós-Napoleão. Era especialista na história diplomática do século XIX e o seu livro "Diplomacia" é uma obra de grande qualidade.
Nesta altura, Kissinger começa as negociações com os comunistas, que exigem uma retirada americana. Kissinger propôe ao presidente norte-americano uma nova ofensiva no Vietname e assim, em Dezembro de 1972, Nixon autoriza o bombardeamento de Natal, durante onze dias, deitando sobre o Vietname mais bombas do que durante toda a 2ª Guerra Mundial. São bombas de Napalm lançadas sobre cidades, incendiando casas e povoações inteiras, causando mais de 3 milhões de mortos. Por causa desta ofensiva, recomeçam as negociações e o Norte recua. Porém só apenas até os Estados Unidos abandonarem o país, porque o exército do Sul é fraco e após 30 de Abril de 1975, quando os últimos norte-americanos deixam o Vietname, o norte passa a controlar o sul e os comunistas unificam o país.
Porém, a guerra na região está longe de acabar: ao longo da guerra com o Vietname, o Laos e o Cambodja foram sucessivamente "utilizados" por ambas as forças, que não respeitam os países vizinhos ao conflito e os Estados Unidos ocupam o Cambodja. Já o Laos sofreu menos nesta altura porque não foi ocupado. Mas no Cambodja, após a retirada norte-americana, os comunistas locais tomam o poder na figura de Pol Pot, instalando um comunismo bárbaro, medieval, utópico. Por exemplo, Pol Pot não autoriza a circulação de dinheiro: tudo é trocado em géneros; as pessoas são movidas da cidade para a aldeia e o regime mata de forma cruel os dissidentes. São muitos milhões que morrem na mão da ditadura terrível de Pol Pot e do Khmer Rouge.
Os comunistas moderados do Vietname invadem o Cambodja e neutralizam Pol Pot e o Khmer Rouge, que foge para as florestas, onde ainda hoje há guerrilhas seguidoras de um dos regimes mais crueis da História. Na altura, os comunistas do Cambodja e do Vietname lutam entre si numa terrível guerra civil onde não se sabe identificar quem está contra quem. Esta guerra termina apenas em 1994, com o fim da Guerra Fria: aí reunem-se à mesa, fazem-se eleições e implementa-se a Paz, com a presença de militares japoneses da ONU que substituem os norte-americanos. O Cambodja está hoje em pleno crescimento económico.
Outra das guerras do Vietname foi contra a China, em 1978,9. Ambos os países tiveram desde sempre uma crescente tensão histórica por problemas de fronteiras. Durante a guerra com os Estados Unidos, o Vietname tem o apoio da URSS e na década de 70 está no auge a tensão entre a URSS e a China. Como tal, há também tensão entre a China e o Vietname. Este ataca a China e após uma vitória inicial, a China desce com o seu vasto exército e o Vietname perde a guerra, retirando-se e não tentando nenhuma ofensiva mais contra os chineses. Hoje terminaram as guerras entre os dois e tenta-se a Paz. Depois da queda do muro de Berlim, o Vietname passa por uma intensa modificação: continua a haver o Partido Comunista no poder mas a economia agora é democrática, permitindo uma expansão económica em larga escala.
Nesta altura, é importante falar também de Watergate. "Gate" é uma palavra inglesa que serve para denunciar um escândalo e Water o nome de um bairro: "o escândalo do bairro Water".
Em 1968, dão-se as eleições para o Parlamento dos Estados Unidos. Este é eleito metade de 2 em dois anos, alternadamente: é uma prática política que visa diminuir a corrupção e hábitos criados pelo que os políticos se vão reciclando de dois em dois anos, interpoladamente. Porém nesta eleição descobre-se um caso de espionagem política: os Republicanos no poder espiam os Democratas e a sua estratégia e isso é revelado, não causando à altura um grande escândalo. Em 1970, Nixon ganha as eleições presidenciais pelos Republicanos. É aí que dois jornalistas, Woodward e Bernstein, pegam no assunto de espiongem e tornam-se novos heróis da sociedade ao conseguirem derrubar o presidente Nixon.
Os dois publicam a história da espionagem quatro anos depois dela acontecer, numa altura em que outro partido estava interessado na história. Nixon reagiu da pior maneira, rejeitando a história e fazendo com que ela crescesse dia após dia. Tanto que começa a impedir a investigação decorrente do processo, num claro abuso de poder e prejúrio, que só teve de novo par na História dos Estados Unidos quando Bill Clinton jurou não ter tido relações com Monica Lewinsky e mentiu também ao povo americano. Aquando de Watergate, a situação aqueceu de tal forma que iam destituir o presidente e antes que isso acontecesse, Nixon demite-se. Isto, em plena saída da guerra do Vietname.
Numa altura em que os americanos se perguntava porque teriam perdido na guerra. Em termos militares poderiam ter continuado a guerra pois eram muito superiores aos vietnamitas. Porém, acontece uma alteração no interior do próprio país: a guerra custa cada vez mais dinheiro e isso começa a pesar no bolso dos americanos. Nixon tenta neutralizar esse facto fazendo com que o mundo inteiro pague a guerra, através de uma desvalorização competitiva da moeda americana. Desvalorizando o dólar, os americanos conseguem que os seus produtos sejam mais baratos e por isso mais atractivos no exterior: baixam 25% do valor à moeda para fazer face à crise. Por outro lado, optam por uma política proteccionista de aumento de taxas aduaneiras para produtos estrangeiros. O reverso da medalha é um decréscimo no poder de compra, que origina falha de produção e desemprego. A guerra do Vietname foi assim a principal causa da crise dos anos 70.
Essa crise fez-se sentir em todo o mundo, com o racionamento do petróleo e da energia. A queda económica traz problemas políticos interiores, conflitos e protestos de jovens contra a guerra, movimentos dos negros, feministas, hippies, etc. Tudo isto debilita os EUA e do outro lado a URSS está a crescer cada vez mais. Tudo cresce a favor do comunismo: o auge é quando em Portugal, no coração da Europa capitalista e da NATA, durante alguns dias, após a Revolução de Abril, os comunistas estiveram no poder, causando o pânico nos Estados Unidos, que prestam toda a atenção política ao desenrolar dos acontecimentos em Portugal.
Nesta altura os Estados Unidos perguntam-se o que hão-de fazer para neutralizar a URSS e a resposta vem mais uma vez de Kissinger. A opção foi a "política do ping-pong", ou seja, estreitar as relações com a China. Quando acaba a guerra civil naquele país, Mao proclama a República Popular da China e os Estados Unidos reconhecem apenas os nacionalistas da Ilha Formosa, que representa a China na ONU. Aconselhado por Kissinger, Nixon reconhece a República Popular da China, iniciando a política diplomática com a deslocação da equipa de ping-pong à China. Assina-se um acordo e os chineses ocupam o seu lugar no Conselho de Segurança da ONU. Trata-se de um acordo estratégico para neutralizar a URSS.
Assim, a guerra do Vietname foi uma fas guerras da Guerra Fria, onde houve milhões de mortos e onde os Estados Unidos perdem não devido à falta de poder militar mas graças à insatisfação e perda de poder económico do país. Não se percebe, no interior do país, qual é o papel dos Estados Unidos no Vietname. É a guerra da televisão, em que esta entra na vida das pessoas e mostra a guerra, ultrapassando a informação dos jornais e permitindo ver e ouvir o que se passa. As imagens são gravadas no Vietname e enviadas de avião no próprio dia, onde são vistas quase em directo e contribuem enormemente para toda a questionação da acção norte-americana.
5.5. Guerra do Vietname
Durante a Guerra Fria houve várias guerras civis apoiadas pela URSS e pelos EUA, pelo mundo fora. Por exemplo, a guerra civil de Angola, disputada durante anos e anos pelo MPLA, apoiado pela URSS e a Unita, apoiada pelos Estados Unidos. Estas guerras entre duas facções apoiadas pelas duas grandes potências sucederam-se um pouco por todo o mundo.
No Vietname, a história foi parecida mas não exactamente assim. O país foi palco da primeira e única guerra no séc. XX que os Estados Unidos perderam, facto que originou uma grave crise económica subsequente. É possível até criar um paralelismo com a actualidade: também a crise actual é desencadeada por um falhanço militar dos Estados Unidos, neste caso no Iraque. Trata-se de guerras muito caras, que quando falham acabam por arrastar a nação mais poderosa do mundo para a crise, e por conseguinte todo o planeta que dela está dependente.
Quanto ao Vietname, trata-se hoje de um território com cerca de 80 milhões de habitantes, um estado que cresce de forma expoente graças à nova economia de um comunismo do séc. XXI baseado na captação de indústria estrangeira e no turismo. De facto, o Vietname é um território que sempre foi cobiçado pelas potências europeias, desde a altura do colonialismo. Está organizado à volta de dois rios, o Vermelho e o Mecong, o que torna o seu terreno muito fértil, acompanhado de um clima tropical chuvoso que propiciam a produção e colheita de arroz duas ou três vezes por ano.
Assim, na segunda metade do século XIX, a França consegue finalmente controlar aquela zona, a da Indochina, constituída pelo Vietname, Laos, Cambodja e uma parte da Tailândia. Trata-se de uma ocupação mal vista pelos locais, que lutam até 1940 pela independência do território. Nesse ano, Hitler invade a Alemanha e a Indochina passa a ser administrada pelo Japão, aliado nazi. Em 1945, depois de perder a guerra e no seguimento de revoltas antecedentes, o Japão retira-se de vez da Indochina e Churchill pressiona os franceses a reconquistarem o território, de forma a poder contrabalançar o poder soviético na zona, já que a China e a URSS eram aliadas à altura. Porém também no Vietname há movimentos independentistas comunistas que fazem com que caso a França não regresse ao local, o território seja dominado pelos comunistas. Churchill, principal impulsionador da cruzada anti-comunista, empurra a França de novo ao local.
Em 1945 acontece a 1ª guerra do Vietname, opondo as guerrilhas vietnamitas apoiadas pela URSS (Vietmin a Norte e Vietcong a Sul) e a França. Após um sucesso francês inicial, a guerrilha consegue cercar todo o exército quando este se preparava para uma batalha crucial em que eliminariam a guerrilha de vez. O exército francês é assim cercado pela guerrilha, impedindo-o de se abastecer e tendo assim que se render. As negociações pós-guerra duram dois anos e são feitas em Genebra, sede da ONU- é acordado um cessar fogo baseado na divisao do Vietname em duas partes pelo paralelo 17 e são organizadas eleições democráticas.
O Norte e o Sul organizam eleições, nas quais o Norte elege comunistas e o Sul não-comunistas (ditadores nomeados pelos Estados Unidos). Gera-se um clima de tensões e acusações permanentes. E no âmbito da política de contenção do comunismo, os americanos envolvem-se na guerra: Kennedy em 1961 envia conselheiros militares para o Vietname e posteriormente envia armamento e mais "conselheiros". Tanto que, em 1964 os Estados Unidos declaram no Congresso oficialmente aberta a guerra contra o Vietname. Enviam 500 mil soldados para aquilo que chamam de luta pela liberdade, lema com o qual pretendem a adesão dos povos ocidentais.
Porém, a Europa não apoia a ofensiva americana: apenas a Austrália e a Coreia do Sul. Embora se refira por vezes o combate dos vietnamitas do sul contra os do norte, quem combate na realidade são os americanos contra os vietnamitas do norte. Esta facto é tornado mais que evidente na Ofensiva Teth, ocorrida no dia 30 de Janeiro de 1968: aqui, os vietcongs, do sul, preparam uma acção militar e atacam simultaneamente 105 cidades no Sul do Vietname, demonstrando que se trata de uma resistência militar maciça contra os americanos e não de uma luta interna ou de um terrorismo do norte contra o sul.
A ofensiva é de tal ordem que até a Embaixada norte-americana em Shangai é atacada. Esta ofensiva é neutralizada pelos americanos mas a partir daqui percebe-se claramente que não haverá nunca vitória no Vietname. Há-que arranjar uma solução e sair do Vietname, à semelhança do que se procura agora no Iraque. Uma solução que mantenha o orgulho americano intacto: desta forma, são iniciadas as negociações entre o norte e o sul conduzidas por Henry Kissinger.
Henry Kissinger, Prémio Nobel da Paz, foi um judeu que fugiu para os Estados Unidos e fez a sua tese de doutoramento sobre Meterlin, um general austríaco da altura pós-Napoleão. Era especialista na história diplomática do século XIX e o seu livro "Diplomacia" é uma obra de grande qualidade.
Nesta altura, Kissinger começa as negociações com os comunistas, que exigem uma retirada americana. Kissinger propôe ao presidente norte-americano uma nova ofensiva no Vietname e assim, em Dezembro de 1972, Nixon autoriza o bombardeamento de Natal, durante onze dias, deitando sobre o Vietname mais bombas do que durante toda a 2ª Guerra Mundial. São bombas de Napalm lançadas sobre cidades, incendiando casas e povoações inteiras, causando mais de 3 milhões de mortos. Por causa desta ofensiva, recomeçam as negociações e o Norte recua. Porém só apenas até os Estados Unidos abandonarem o país, porque o exército do Sul é fraco e após 30 de Abril de 1975, quando os últimos norte-americanos deixam o Vietname, o norte passa a controlar o sul e os comunistas unificam o país.
Porém, a guerra na região está longe de acabar: ao longo da guerra com o Vietname, o Laos e o Cambodja foram sucessivamente "utilizados" por ambas as forças, que não respeitam os países vizinhos ao conflito e os Estados Unidos ocupam o Cambodja. Já o Laos sofreu menos nesta altura porque não foi ocupado. Mas no Cambodja, após a retirada norte-americana, os comunistas locais tomam o poder na figura de Pol Pot, instalando um comunismo bárbaro, medieval, utópico. Por exemplo, Pol Pot não autoriza a circulação de dinheiro: tudo é trocado em géneros; as pessoas são movidas da cidade para a aldeia e o regime mata de forma cruel os dissidentes. São muitos milhões que morrem na mão da ditadura terrível de Pol Pot e do Khmer Rouge.
Os comunistas moderados do Vietname invadem o Cambodja e neutralizam Pol Pot e o Khmer Rouge, que foge para as florestas, onde ainda hoje há guerrilhas seguidoras de um dos regimes mais crueis da História. Na altura, os comunistas do Cambodja e do Vietname lutam entre si numa terrível guerra civil onde não se sabe identificar quem está contra quem. Esta guerra termina apenas em 1994, com o fim da Guerra Fria: aí reunem-se à mesa, fazem-se eleições e implementa-se a Paz, com a presença de militares japoneses da ONU que substituem os norte-americanos. O Cambodja está hoje em pleno crescimento económico.
Outra das guerras do Vietname foi contra a China, em 1978,9. Ambos os países tiveram desde sempre uma crescente tensão histórica por problemas de fronteiras. Durante a guerra com os Estados Unidos, o Vietname tem o apoio da URSS e na década de 70 está no auge a tensão entre a URSS e a China. Como tal, há também tensão entre a China e o Vietname. Este ataca a China e após uma vitória inicial, a China desce com o seu vasto exército e o Vietname perde a guerra, retirando-se e não tentando nenhuma ofensiva mais contra os chineses. Hoje terminaram as guerras entre os dois e tenta-se a Paz. Depois da queda do muro de Berlim, o Vietname passa por uma intensa modificação: continua a haver o Partido Comunista no poder mas a economia agora é democrática, permitindo uma expansão económica em larga escala.
Nesta altura, é importante falar também de Watergate. "Gate" é uma palavra inglesa que serve para denunciar um escândalo e Water o nome de um bairro: "o escândalo do bairro Water".
Em 1968, dão-se as eleições para o Parlamento dos Estados Unidos. Este é eleito metade de 2 em dois anos, alternadamente: é uma prática política que visa diminuir a corrupção e hábitos criados pelo que os políticos se vão reciclando de dois em dois anos, interpoladamente. Porém nesta eleição descobre-se um caso de espionagem política: os Republicanos no poder espiam os Democratas e a sua estratégia e isso é revelado, não causando à altura um grande escândalo. Em 1970, Nixon ganha as eleições presidenciais pelos Republicanos. É aí que dois jornalistas, Woodward e Bernstein, pegam no assunto de espiongem e tornam-se novos heróis da sociedade ao conseguirem derrubar o presidente Nixon.
Os dois publicam a história da espionagem quatro anos depois dela acontecer, numa altura em que outro partido estava interessado na história. Nixon reagiu da pior maneira, rejeitando a história e fazendo com que ela crescesse dia após dia. Tanto que começa a impedir a investigação decorrente do processo, num claro abuso de poder e prejúrio, que só teve de novo par na História dos Estados Unidos quando Bill Clinton jurou não ter tido relações com Monica Lewinsky e mentiu também ao povo americano. Aquando de Watergate, a situação aqueceu de tal forma que iam destituir o presidente e antes que isso acontecesse, Nixon demite-se. Isto, em plena saída da guerra do Vietname.
Numa altura em que os americanos se perguntava porque teriam perdido na guerra. Em termos militares poderiam ter continuado a guerra pois eram muito superiores aos vietnamitas. Porém, acontece uma alteração no interior do próprio país: a guerra custa cada vez mais dinheiro e isso começa a pesar no bolso dos americanos. Nixon tenta neutralizar esse facto fazendo com que o mundo inteiro pague a guerra, através de uma desvalorização competitiva da moeda americana. Desvalorizando o dólar, os americanos conseguem que os seus produtos sejam mais baratos e por isso mais atractivos no exterior: baixam 25% do valor à moeda para fazer face à crise. Por outro lado, optam por uma política proteccionista de aumento de taxas aduaneiras para produtos estrangeiros. O reverso da medalha é um decréscimo no poder de compra, que origina falha de produção e desemprego. A guerra do Vietname foi assim a principal causa da crise dos anos 70.
Essa crise fez-se sentir em todo o mundo, com o racionamento do petróleo e da energia. A queda económica traz problemas políticos interiores, conflitos e protestos de jovens contra a guerra, movimentos dos negros, feministas, hippies, etc. Tudo isto debilita os EUA e do outro lado a URSS está a crescer cada vez mais. Tudo cresce a favor do comunismo: o auge é quando em Portugal, no coração da Europa capitalista e da NATA, durante alguns dias, após a Revolução de Abril, os comunistas estiveram no poder, causando o pânico nos Estados Unidos, que prestam toda a atenção política ao desenrolar dos acontecimentos em Portugal.
Nesta altura os Estados Unidos perguntam-se o que hão-de fazer para neutralizar a URSS e a resposta vem mais uma vez de Kissinger. A opção foi a "política do ping-pong", ou seja, estreitar as relações com a China. Quando acaba a guerra civil naquele país, Mao proclama a República Popular da China e os Estados Unidos reconhecem apenas os nacionalistas da Ilha Formosa, que representa a China na ONU. Aconselhado por Kissinger, Nixon reconhece a República Popular da China, iniciando a política diplomática com a deslocação da equipa de ping-pong à China. Assina-se um acordo e os chineses ocupam o seu lugar no Conselho de Segurança da ONU. Trata-se de um acordo estratégico para neutralizar a URSS.
Assim, a guerra do Vietname foi uma fas guerras da Guerra Fria, onde houve milhões de mortos e onde os Estados Unidos perdem não devido à falta de poder militar mas graças à insatisfação e perda de poder económico do país. Não se percebe, no interior do país, qual é o papel dos Estados Unidos no Vietname. É a guerra da televisão, em que esta entra na vida das pessoas e mostra a guerra, ultrapassando a informação dos jornais e permitindo ver e ouvir o que se passa. As imagens são gravadas no Vietname e enviadas de avião no próprio dia, onde são vistas quase em directo e contribuem enormemente para toda a questionação da acção norte-americana.
23/10/08
MIC - Aula 3
SECÇÃO 2: TÉCNICAS DE CONSTRUÇÃO DE UM CORPUS DE PESQUISA
1. Técnicas de entrevista (individuais e de grupo)
2. Observação participante
3. Inquérito por questionário
Como resumo, podemos dizer que as ciências sociais demarcam-se de alguns conhecimentos, como o senso comum, por exemplo. Trabalham com técnicas, métodos e teorias: ferramentas com diferentes papeis em todo o processo. As teorias disponíveis servem de apoio à formulação de hipóteses e permitem clarificar a investigação. Juntamente com o pensamento imaginativo sobre algo mais do que o que já sabemos, organizamos hipóteses. Estas são construídas para que a partir do problema possamos procurar algo mais do que já sabemos. Procuramos um sentido social, sentidos novos através de hipóteses ricas e pertinentes: uma posição científica deve ser refutável e não ter tido já refutação. Se já foram refutadas, as proposições científicas não servem: é aqui que se dá a ruptura para a verificação.
Através da ruptura com o senso comum, apoiamo-nos em teorias e formulamos hipóteses, rompendo com as teorias existentes. Iniciamos então a pesquisa empírica utilizando o método, com forte utilização das técnicas, estabelecido pela metodologia, ou seja, a estratégia de investigação.
No que respeita aos métodos, estes dividem-se pelos métodos experimentais, qualitativos e quantitativos. Os métodos experimentais contemplam contextos de observação controlada, artificiais ou quase artificiais e são pouco usados em ciências sociais. Por exemplo, grupos em sociologia para se analisar os líderes de determinado contexto consoante um conjunto de variáveis. Trata-se de indivíduos com planos de acção muito claros em contextos específicos. Porém, não sabemos nunca o que fica de fora do nosso controlo. As experiências de laboratório em Ciências Sociais em que as pessoas são escolhidas são muito mais complexas: os comportamentos e a reflexividade dos indivíduos alteram-se consoante o contexto. São, de facto, experiências muito complicadas mas onde podemos pensar do ponto de vista epistemológico, vendo que qualquer entrevista é experimental, uma vez que foge do quotidiano normal do entrevistado.
Em relação aos métodos quantitativos, estes procuram causas, são mais gerais e permitem encontrar grandes regularidades objectivas que estão para lá da observação directa. Procuram explicar fenómenos, trabalhando com populações grandes para encontrar padrões e assim trabalhá-los estatisticamente. Um inquérito, o veículo mais utilizado nos métodos quantitativos, têm um guião rígido que não se pode alterar e como tal o inquérito é entregue a alguém que o administra e que pode perfeitamente estar de fora da investigação: o inquérito é imutável, rígido.
Já os métodos qualitativos, trabalham com a compreensão, o sentido e por isso em pequenos contextos que são controláveis pelo próprio investigador. São populações muito pequenas, capazes de serem controladas e onde não há delegação. A procura de sentido faz com que as técnicas não sejam usadas de forma definida logo à partida: podemos usar inquéritos ou não, entrevistas ou não. No estudo em profundidade, não temos a mesma rigidez técnica dos métodos quantitativos. Nos métodos qualitativos, quero saber porquê e como os estudantes fazem as suas escolhas e não apenas quantos fazem determinada escolha. Podem utilizar-se perguntas abertas, quando não sei que respostas devo pôr ou quando procuro, de facto, um novo discurso. As perguntas abertas podem depois ser tratadas do ponto de vista qualitativo ou quantitativo ou ambos.
Pelo método quantitativo, pretendo agrupar e comparar, obtendo apenas grandes regularidades: embora o inquérito possa conter questões mais finas, chego pouco ao profundo das questões. Isto também porque embora o inquérito possa ser anónimo, sentimos sempre desconforto perante a hipótese de ver as nossas respostas lidas. O inquérito é superficial mas depois o investigador aprofunda, na sua análise. Como as desvantagens dum são as vantagens doutro, o melhor é utilizar os dois métodos: inquérito e entrevista.
No que respeita às técnicas de observação, estas podem ser directas ou indirectas/ deferidas. A observação directa pode ser participante, quando o investigador entra no grupo e vive como as pessoas desse grupo ("Street Corner Society" p.e.); semi-participante, onde a participação é difícil de definir mas onde a distância é mantida, embora seja o resultado de uma situação em que mesmo inconscientemente o investigador intervém- o contacto poderá ser feito, por exemplo, no chamado "contexto de corredor"; e não participante ou sistemática em que se faz a observação directa, por exemplo, de um evento mas não participo dele: ouço, vejo, registo sem fazer perguntas uma vez que as perguntas por si só interferem. Como exemplo da observação não participante, o público num cinema.
A problemática do distanciamento e envolvimento prende-se intimamente com os estudos de caso, ou seja, as análises qualitativas. Posso-me "apaixonar" pelo documento que estudo, seja um filme, um texto ou uma pessoa e corro o risco de não me distanciar o suficiente do objecto: tenho, por isso que gerir o envolvimento e o distanciamento da melhor forma. Trata-se da "arte de bem perguntar", segundo Virgínia Ferreira ou da "arte de obter respostas sem fazer perguntas", segundo Firmino Costa.
No que respeita às entrevistas, estas podem ser estruturadas, semi-estruturadas e não estruturadas. Podem ser ainda indivíduais ou de grupo (focus group). Quanto às técnicas documentais, pode recorrer-se à amostragem, estatística e análise de conteúdos. Esta última a nível do discurso escrito e oral e da narrativa (oral, visual, imagética ou gestual.
Relativamente às técnicas, pode haver diferentes interpretações: as técnicas documentais são relativamente transversais aos métodos, dependendo apenas uma maior ou menor estruturação dessas técnicas. O inquérito é a mais estruturada das entrevistas. Porém, o tipo ideal de entrevistas não estruturadas é quando não há perguntas (p.e. entrevistas clínicas psicanalíticas). Normalmente, em investigação usamos um misto entre estruturada e não estruturada. A entrevista não é tão rígida comoo questionário e é feita sempre por um entrevistador qualificado, ao passo que o inquérito pode ser realizado por qualquer pessoa que reuna as condições mínimas (saber ler, compreender a amostra, ter boa apresentação).
As entrevistas semi e não estruturadas são entrevistas em profundidade: vou querer conhecer algo a partir do meu entrevistado, quero que ele me mostre mais do que aquilo que diz à partida. Assim, as análises qualitativas levam-me a descobrir um sentido pela singularidade, enquanto as quantitativas pretendem chegar a informação que permita fazer uma análise estatística.
Relativamente à amostra, além daquelas que vimos existe a amostra por painel e o focus group. A amostra por painel trata-se da construção de uma amostra probabilística que se mantem por observação repetida. Por exemplo, selecciona-se dez pessoas e em dois momentos administra-se o mesmo inquérito. A audiometria, por exemplo, constitui um exemplo de amostragem por painel, neste caso de famílias.
O focus group pode ser homo ou heterogéneo. Fazemos uma entrevista mais estruturada ou menos a um grupo seleccionado para o efeito, como por exemplo os quadros de topo de uma empresa. Tentamos apanhar regularidades cuja manifestação seja transversal aos indivíduos. O grupo pode ser homogeneizado pelo grupo de pertença para tentar obter respostas sobre algo de forma a que as respostas sejam representativas sobre o assunto.
Por fim, damos uma codificação, no método estatístico, às categorias, que é numérica nos métodos quantitativos e uma palavra nos qualitativos. Transformamos assim toda a informação em números, organizando desta forma as diversas variáveis.
1. Técnicas de entrevista (individuais e de grupo)
2. Observação participante
3. Inquérito por questionário
Como resumo, podemos dizer que as ciências sociais demarcam-se de alguns conhecimentos, como o senso comum, por exemplo. Trabalham com técnicas, métodos e teorias: ferramentas com diferentes papeis em todo o processo. As teorias disponíveis servem de apoio à formulação de hipóteses e permitem clarificar a investigação. Juntamente com o pensamento imaginativo sobre algo mais do que o que já sabemos, organizamos hipóteses. Estas são construídas para que a partir do problema possamos procurar algo mais do que já sabemos. Procuramos um sentido social, sentidos novos através de hipóteses ricas e pertinentes: uma posição científica deve ser refutável e não ter tido já refutação. Se já foram refutadas, as proposições científicas não servem: é aqui que se dá a ruptura para a verificação.
Através da ruptura com o senso comum, apoiamo-nos em teorias e formulamos hipóteses, rompendo com as teorias existentes. Iniciamos então a pesquisa empírica utilizando o método, com forte utilização das técnicas, estabelecido pela metodologia, ou seja, a estratégia de investigação.
No que respeita aos métodos, estes dividem-se pelos métodos experimentais, qualitativos e quantitativos. Os métodos experimentais contemplam contextos de observação controlada, artificiais ou quase artificiais e são pouco usados em ciências sociais. Por exemplo, grupos em sociologia para se analisar os líderes de determinado contexto consoante um conjunto de variáveis. Trata-se de indivíduos com planos de acção muito claros em contextos específicos. Porém, não sabemos nunca o que fica de fora do nosso controlo. As experiências de laboratório em Ciências Sociais em que as pessoas são escolhidas são muito mais complexas: os comportamentos e a reflexividade dos indivíduos alteram-se consoante o contexto. São, de facto, experiências muito complicadas mas onde podemos pensar do ponto de vista epistemológico, vendo que qualquer entrevista é experimental, uma vez que foge do quotidiano normal do entrevistado.
Em relação aos métodos quantitativos, estes procuram causas, são mais gerais e permitem encontrar grandes regularidades objectivas que estão para lá da observação directa. Procuram explicar fenómenos, trabalhando com populações grandes para encontrar padrões e assim trabalhá-los estatisticamente. Um inquérito, o veículo mais utilizado nos métodos quantitativos, têm um guião rígido que não se pode alterar e como tal o inquérito é entregue a alguém que o administra e que pode perfeitamente estar de fora da investigação: o inquérito é imutável, rígido.
Já os métodos qualitativos, trabalham com a compreensão, o sentido e por isso em pequenos contextos que são controláveis pelo próprio investigador. São populações muito pequenas, capazes de serem controladas e onde não há delegação. A procura de sentido faz com que as técnicas não sejam usadas de forma definida logo à partida: podemos usar inquéritos ou não, entrevistas ou não. No estudo em profundidade, não temos a mesma rigidez técnica dos métodos quantitativos. Nos métodos qualitativos, quero saber porquê e como os estudantes fazem as suas escolhas e não apenas quantos fazem determinada escolha. Podem utilizar-se perguntas abertas, quando não sei que respostas devo pôr ou quando procuro, de facto, um novo discurso. As perguntas abertas podem depois ser tratadas do ponto de vista qualitativo ou quantitativo ou ambos.
Pelo método quantitativo, pretendo agrupar e comparar, obtendo apenas grandes regularidades: embora o inquérito possa conter questões mais finas, chego pouco ao profundo das questões. Isto também porque embora o inquérito possa ser anónimo, sentimos sempre desconforto perante a hipótese de ver as nossas respostas lidas. O inquérito é superficial mas depois o investigador aprofunda, na sua análise. Como as desvantagens dum são as vantagens doutro, o melhor é utilizar os dois métodos: inquérito e entrevista.
No que respeita às técnicas de observação, estas podem ser directas ou indirectas/ deferidas. A observação directa pode ser participante, quando o investigador entra no grupo e vive como as pessoas desse grupo ("Street Corner Society" p.e.); semi-participante, onde a participação é difícil de definir mas onde a distância é mantida, embora seja o resultado de uma situação em que mesmo inconscientemente o investigador intervém- o contacto poderá ser feito, por exemplo, no chamado "contexto de corredor"; e não participante ou sistemática em que se faz a observação directa, por exemplo, de um evento mas não participo dele: ouço, vejo, registo sem fazer perguntas uma vez que as perguntas por si só interferem. Como exemplo da observação não participante, o público num cinema.
A problemática do distanciamento e envolvimento prende-se intimamente com os estudos de caso, ou seja, as análises qualitativas. Posso-me "apaixonar" pelo documento que estudo, seja um filme, um texto ou uma pessoa e corro o risco de não me distanciar o suficiente do objecto: tenho, por isso que gerir o envolvimento e o distanciamento da melhor forma. Trata-se da "arte de bem perguntar", segundo Virgínia Ferreira ou da "arte de obter respostas sem fazer perguntas", segundo Firmino Costa.
No que respeita às entrevistas, estas podem ser estruturadas, semi-estruturadas e não estruturadas. Podem ser ainda indivíduais ou de grupo (focus group). Quanto às técnicas documentais, pode recorrer-se à amostragem, estatística e análise de conteúdos. Esta última a nível do discurso escrito e oral e da narrativa (oral, visual, imagética ou gestual.
Relativamente às técnicas, pode haver diferentes interpretações: as técnicas documentais são relativamente transversais aos métodos, dependendo apenas uma maior ou menor estruturação dessas técnicas. O inquérito é a mais estruturada das entrevistas. Porém, o tipo ideal de entrevistas não estruturadas é quando não há perguntas (p.e. entrevistas clínicas psicanalíticas). Normalmente, em investigação usamos um misto entre estruturada e não estruturada. A entrevista não é tão rígida comoo questionário e é feita sempre por um entrevistador qualificado, ao passo que o inquérito pode ser realizado por qualquer pessoa que reuna as condições mínimas (saber ler, compreender a amostra, ter boa apresentação).
As entrevistas semi e não estruturadas são entrevistas em profundidade: vou querer conhecer algo a partir do meu entrevistado, quero que ele me mostre mais do que aquilo que diz à partida. Assim, as análises qualitativas levam-me a descobrir um sentido pela singularidade, enquanto as quantitativas pretendem chegar a informação que permita fazer uma análise estatística.
Relativamente à amostra, além daquelas que vimos existe a amostra por painel e o focus group. A amostra por painel trata-se da construção de uma amostra probabilística que se mantem por observação repetida. Por exemplo, selecciona-se dez pessoas e em dois momentos administra-se o mesmo inquérito. A audiometria, por exemplo, constitui um exemplo de amostragem por painel, neste caso de famílias.
O focus group pode ser homo ou heterogéneo. Fazemos uma entrevista mais estruturada ou menos a um grupo seleccionado para o efeito, como por exemplo os quadros de topo de uma empresa. Tentamos apanhar regularidades cuja manifestação seja transversal aos indivíduos. O grupo pode ser homogeneizado pelo grupo de pertença para tentar obter respostas sobre algo de forma a que as respostas sejam representativas sobre o assunto.
Por fim, damos uma codificação, no método estatístico, às categorias, que é numérica nos métodos quantitativos e uma palavra nos qualitativos. Transformamos assim toda a informação em números, organizando desta forma as diversas variáveis.
22/10/08
HMC - Aula 8
5.4. Conflitos da "guerra fria rígida": crise de Berlim, guerra da Coreia, crise de Cuba
No âmbito da situação de Guerra Fria instalada no mundo no pós II Guerra, surgem uma série de conflitos em vários pontos do globo, na fase em que foi chamada de "guerra fria rígida" pois não existiam relações entre os Estados Unidos e a União Soviética. O primeiro desses confrontos foi a crise de Berlim, em 1958.
Não obstante os esforços soviéticos para a reconstrução do lado comunista da Alemanha, a RDA continua anos-luz de se aproximar do desenvolvimento e da recuperação presente no lado ocidental. Além disso, as fronteiras abertas da cidade de Berlim faziam com que milhares de alemães fugissem da Alemanha comunista, fascinados com as facilidades e as montras das lojas da Alemanha Ocidental. Numa tentativa de impedir o abastecimento da zona ocidental de Berlim, circundada pela Alemanha comunista e na esperança de que os Aliados fossem ceder o resto da cidade aos comunistas, Stalin manda realizar um bloqueio a Berlim ocidental. Nada nem ninguém podia chegar àquela cidade, causando graves cortes de produtos básicos e colocando a parte ocidental da cidade num total isolamento.
Os Aliados não sabem como reagir, uma vez que o confronto directo estava fora de questão, quer pelo poderio do exército Vermelho, quer pela ameaça do ataque nuclear. A solução para evitar uma guerra entre as duas potências é encontrada pelos Ocidente, que inicia uma ponte aérea: de avião, os ocidentais transportam comida e bebida nos aviões B52 que antes foram utilizados na guerra para carregar bombas. Por outro lado, a tecnologia dos radares permitem também ao Ocidente levar a cabo um vai-vém de aviões: enquanto uns aterram, outros estão a decolar indo buscar mais mantimentos.
Assim, Stalin não consegue quebrar o abastecimento de Berlim, permitindo passado um ano que continue o abastecimento a ser feito pela via terrestre, acalmando a tensão e a crise entre as duas Alemanhas nos dez anos seguintes. Em 1961, já depois da morte de Stalin e com Nikita Kruchtchev no comando da União Soviética, é feita uma nova tentativa para suster a população em fuga para o Ocidente e para pressionar os ocidentais a sair de Berlim. Não conseguindo, os comunistas vão cercar Berlim ocidental para que não haja qualquer contacto com o exterior nem possibilidade de êxodo populacional através da construção, na madrugada de 12 para 13 de Agosto de 1961, do Muro de Berlim, sob o comando de Walter Ulbricht.
Berlim passa então a estar circunscrita por um muro de três metros, intransponível, que contém entre 60 a 250 quilómetros, consoante as versões ocidentais ou comunistas. Do lado de cá, torna-se necessário apoiar a isolada Berlim ocidental, pelo que John Kennedy se desloca à cidade e proclama o célebre discurso em que diz apaixonadamente "Ich bin ein Berliner!"
O segundo destes conflitos entre as duas potências ideológicas é a guerra da Coreia, onde além de conflito e tensão, houve efectivamente guerra. A Coreia é uma península asiática, cuja cultura é relativamente independente da China e do Japão. No início do séc. XX, o Japão anexa a Coreia em parte do seu território e assim fica até ao final da 2ª Guerra. Após o final da guerra, a Coreia recupera a independência mas surge a situação idêntica a outros pontos do globo, como a Grécia, em que a Norte o movimento de libertação é liderado pelos comunistas, apoiado pela União Soviética e China e a Sul pelos capitalistas, apoiados pelos americanos. Criam-se assim, também, dois exércitos libertadores com duas ideologias diferentes. Nessa altura fazem-se eleições e o povo decide qual o regime: porém no Norte ganham os comunistas e no sul os liberais, não se entendendo quanto a um consenso e criando uma situação insustentável de tensão entre dois governos: o do norte, comunista e coreano, o do sul, liberal e com presença efectiva dos americanos.
A 25 de Junho de 1950, os comunistas exigem a retirada dos americanos do território coreano e das suas tropas no sul. Uma vez que esta vontade não foi obedecida, os coreanos do norte iniciam investidas contra os americanos, empurrando-os para uma linha de defesa a sul, praticamente perdendo todo o território da Coreia. Como retaliação os americanos queixam-se na ONU contra a ofensiva, que designam como agressão do norte ao sul. A ONU pede esforços aos países para ajudar e no Conselho de Segurança é dado o apoio aos Estados Unidos. Isto, unicamente porque a União Soviética não está presente e a China é representada pela insignificante região de Taiwan, controlada pelos americanos. A ausência da Rússia, para os média, prende-se com um atraso no trânsito mas o que de facto aconteceu é que houve uma jogada política, em que a União Soviética imaginou que não estando presente, não seria nada decidido. Foi úm de dois únicos Conselhos de Segurança da ONU em que todos estiveram de acordo quanto a uma investida militar: o segundo foi já nos anos 90, quando Ieltsin concordou com Bush para a Guerra do Golfo.
Tomada a decisão por maioria no Conselho de Segurança da ONU, a jogada ocidental vence e a ONU envia os seus capacetes azuis para expulsar a Coreia do Norte do território que ocupou. Em 1950 e 51 as tropas da ONU, que eram constituídas apenas por americanos e alguns australianos "voluntários", começam a puxar os coreanos para o norte, a ponto de se aproximar da República Popular da China. Mao assusta-se com a proximidade dos americanos e ordena aos seus soldados, supostamente "voluntários" que vão ajudar os comunistas coreanos.
Pela primeira e única vez na História há um choque directo entre tropas chinesas e norte-americanas. E como a China não possui nesta altura a bomba atómica, McCarthy, general americano responsável, quer lançar na China a bomba atómica, facto que dificilmente deixaria a União Soviética quieta e que poderia assim ser o rastilho para a guerra atómica.
Em 1952, a guerra torna-se uma terrível crise, com os chineses a conseguirem empurrar os americanos cada vez mais para o Sul: não são tecnologicamente avançados mas são num número tão grande que conseguem derrotar os americanos. A 27 de Julho de 1953 cessa o combate e é assinado o armistício, dividindo as duas Coreias pelo paralelo 38, que ainda hoje as divide. Uma sob a alçada chinesa e soviética, a Norte, outra sob a alçada norte-americana, a sul. Hoje, a Coreia do Norte permanece um regime comunista, um dos regimes mais radicais do mundo; a Coreia do Sul é um dos países mais ricos e desenvolvidos do mundo, graças à ajuda americana. A ideia da união entre as Coreias era defendida por todas as partes tendo-se estudado esse molde até chegar George Bush e afastar a união da Coreia do Sul com um dos países do "eixo do mal".
A guerra da Coreia era no início uma guerra local mas com a ameaça atómica podia tornar-se um conflito mundial. Não se tornou porque o presidente Truman demitiu McCarthy, muito também por causa de um jogo entre eles, que se confrontaram nas eleições presidenciais.
O terceiro conflito deste período é a crise de Cuba. Cuba foi a primeira ilha colonial espanhola a ser povoada, a menina dos olhos da coroa para onde emigraram muitos galegos, principalmente. Trata-se de um território maior que Portugal e com cerca de 11 milhões de habitantes. Embora não possua muito petróleo, tem agricultura (tabaco, cana de açucar, rum) e turismo. No fim do séc. XIX dá-se uma guerra entre Espanha e os Estados Unidos por causa de Cuba: como habitualmente, os americanos instigam uma força qualquer à independência para depois a provocarem e lá se instalarem. Espanha e a sua "frota invencible" são derrotadas e os Estados Unidos passam a controlar Cuba, assim como muitos outros territórios na América Latina e Sul Asiático que perteceram aos espanhóis. Surge depois a discussão sobre se deveria Cuba ser integrada nos Estados Unidos mas optam por oficialmente não incluir o país, embora enviem exército e obriguem o governo provisório local a autorizar a intervenção americana sempre que estes assim o desejem.
Cuba torna-se assim o "bordel" dos americanos, com bom clima, muito rum, charutos e o controlo total de qualquer resistência à ocupação americana. Porém, nos anos 50, devido à desastrosa e odiada governação de Urgencio Baptista, uma força levanta-se contra ele, liderada por Fidel Castro e "Che" Ernesto Guevara. Fidel consegue, com o apoio de toda a população, destruir o detestado regime de Baptista e entra triunfalmente em Havana, depois de uma breve luta com 80 homens na Sierra Maestra. Isto acontece na noite de Ano Novo, de 58 para 59, enquanto os governantes pró-americanos comemoravam o Ano Novo: a partir de 1 de Janeiro de 1959 começa uma nova governação em Cuba.
A partir de então começa a nacionalização de propriedade americana, facto que leva à revolta dos Estados Unidos e a uma investida militar, a Baía dos Porcos, onde os americanos saem vergonhosamente derrotados. Fidel Castro derrota a invasão da Baía dos Porcos e há várias histórias e teorias sobre a preparação desse golpe, de ambos os lados. Os americanos contavam com o apoio dos cubanos mas a verdade é que naquela altura estavam todos ao lado de Fidel. Este pede ajuda à União Soviética, proclamando só aqui a adopção da doutrina marxista. Este pedido cai como uma luva nas intenções da União Soviética: tempos antes os Estados Unidos haviam montado misseis na Turquia apontados à União Soviética- esta será a hipótese da URSS colocar agora mísseis perto do território americano, em Cuba.
A 22 de Outubro de 1962, Kennedy descobre através de aviões espia que a URSS tem mísseis com ogivas nucleares em Cuba e faz um ultimato: ou retiram o arsenal de guerra de Cuba ou os Estados Unidos vão atacar. Antes da URSS responder, foram dez dias de suspense que mudaram o mundo. Tratou-se de uma situação verdadeiramente dramática, de verdadeira crise, em que não se sabe o que vai acontecer. A 28 de Outubro de 1962, os soviéticos iniciam a desmontagem dos seus mísseis em Cuba, com a contrapartida dos americanos desmontarem os seus mísseis na Turquia e em Itália. Ainda hoje não se sabe bem quem ganhou esta crise...
Sabe-se sim que a partir de então estabelece-se o famoso "telefone vermelho" entre o presidente soviético e o americano, apelidado de "hotline": isto porque se compreende que a origem desta crise foi muito em parte devido à falta de comunicação entre os dois estados, apenas uma guerra rígida, em que se imagina que ambos os estados possuem um "botão vermelho" capaz de acabar com a Humanidade.
No período da guerra rígida, duas personalidades destacam-se de cada um dos polos ideológicos: John Kennedy, do lado americano e Nikita Khruchtchev, do lado soviético.
John Kennedy nasceu em 1917 e foi assassinado em 1963, em Dallas. Estudou em Harvard, foi um herói da 2ª Guerra em batalhas no Pacífico e provém de uma família abastada. Líder dos democratas, foi o mais jovem presidente americano, com apenas 43 anos. Era um homem jovem, bonito, bom aluno, com um casamento exemplar com uma mulher igualmente bonita, Jackie Kennedy e com fama de sedutor entre as mulheres, entre as quais Marilyn Monroe. Era também o primeiro presidente católico, o que desperta tensão entre os protestantes, que começam a imaginar se não será um avanço do Papa nos EUA. Ganha as eleições sem se esperar, muito por causa de um famoso debate televisivo, onde se consta que Kennedy utilizou a televsião para se aproveitar do seu aspecto em detrimento de Nixon e assim superá-lo.
Seja como for, Kennedy foi um político fraco. A sua principal inovação, a "nova fronteira" era uma política interna de acção social que por estar vagamente definida, fracassou e nunca foi realizada. Externamente, promoveu a "Aliança para o Progresso" com vista a resolver os inúmeros conflitos na América Latina, onde tinham sido instaladas ditaduras de direita patrocinadas pelos EUA e suas empresas. Foi Kennedy que começou, também, a Guerra do Vietname. Trata-se assim de uma governação desastrosa- o ícone de mito fica só para a História porque Kennedy foi assassinado e porque era duro com os soviéticos. Porém, tudo o que fez falhou e nem do ponto de vista pessoal parecia ter, volvidos os anos, algum interesse. Kennedy conduziu a crise de Cuba e como era um político inexperiente falhou ao lançar um ultimato e colocar assim o mundo inteiro em risco. Ainda se desconhece oficialmente quem o matou e hoje é um símbolo nos Estados Unidos, principalmente pela sua resistência e dureza com os comunistas.
Do lado soviético, sobressai Nikita Kruchtchev, que nasceu em 1894, na Ucrânia e morreu em 1971, em Moscovo. Nikita é filho do proletariado russo, subiu na lista do Partido e não possuía grande instrução e de todo não tinha maneiras refinadas nem regras de etiqueta. Depois da morte de Lenin, em 1953, ganha a guerra pela liderança do Partido Comunista da URSS e é eleito no 20º Congresso do partido, secretário geral e por conseguinte líder da URSS. Num famoso discurso, Nikita denuncia os crimes que Stalin cometeu, acusando-o de genocídio com as suas deslocações de camponeses. Se com esta denúncia se torna muito popular no Ocidente, torna-se impopular entre as camadas conservadoras do PCUS, que vêm nele um embaraço para os soviéticos e nas suas reformas uma ameaça ao comunismo.
Entre outras coisas, Nikita tinha atitudes grosseiras de interromper líderes de estado para os insultar, tendo chegado a tirar os sapatos e a batê-los na mesa de discussão do Conselho de Segurança da ONU, esfregado uma bota na cara de Mao ou tecido comentários racistas sobre os búlgaros na presença do representante búlgaro. Não era, assim, o líder soviético típico. Sabia porém utilizar bem o poder da televisão e manipulá-la para os seus interesses. Embora não tivesse grandes conhecimentos do mundo exterior, foi convidado a visitar os Estados Unidos, onde chegou a discursar, tornando-se muito popular no Ocidente. Era impetuoso, voluntarioso e como recuou na crise de Cuba e como queria impor algumas reformas, foi afastado passados dois anos da liderança soviética.
Em suma, no decorrer da guerra rígida, dão-se os conflitos de Berlim, Coreia e Cuba. Este último resultou num bloqueio naval dos Estados Unidos a Cuba que dura até hoje, não permintindo que nada entre na ilha via marítima. Barack Obama promete uma negociação com os cubanos.
No âmbito da situação de Guerra Fria instalada no mundo no pós II Guerra, surgem uma série de conflitos em vários pontos do globo, na fase em que foi chamada de "guerra fria rígida" pois não existiam relações entre os Estados Unidos e a União Soviética. O primeiro desses confrontos foi a crise de Berlim, em 1958.
Não obstante os esforços soviéticos para a reconstrução do lado comunista da Alemanha, a RDA continua anos-luz de se aproximar do desenvolvimento e da recuperação presente no lado ocidental. Além disso, as fronteiras abertas da cidade de Berlim faziam com que milhares de alemães fugissem da Alemanha comunista, fascinados com as facilidades e as montras das lojas da Alemanha Ocidental. Numa tentativa de impedir o abastecimento da zona ocidental de Berlim, circundada pela Alemanha comunista e na esperança de que os Aliados fossem ceder o resto da cidade aos comunistas, Stalin manda realizar um bloqueio a Berlim ocidental. Nada nem ninguém podia chegar àquela cidade, causando graves cortes de produtos básicos e colocando a parte ocidental da cidade num total isolamento.
Os Aliados não sabem como reagir, uma vez que o confronto directo estava fora de questão, quer pelo poderio do exército Vermelho, quer pela ameaça do ataque nuclear. A solução para evitar uma guerra entre as duas potências é encontrada pelos Ocidente, que inicia uma ponte aérea: de avião, os ocidentais transportam comida e bebida nos aviões B52 que antes foram utilizados na guerra para carregar bombas. Por outro lado, a tecnologia dos radares permitem também ao Ocidente levar a cabo um vai-vém de aviões: enquanto uns aterram, outros estão a decolar indo buscar mais mantimentos.
Assim, Stalin não consegue quebrar o abastecimento de Berlim, permitindo passado um ano que continue o abastecimento a ser feito pela via terrestre, acalmando a tensão e a crise entre as duas Alemanhas nos dez anos seguintes. Em 1961, já depois da morte de Stalin e com Nikita Kruchtchev no comando da União Soviética, é feita uma nova tentativa para suster a população em fuga para o Ocidente e para pressionar os ocidentais a sair de Berlim. Não conseguindo, os comunistas vão cercar Berlim ocidental para que não haja qualquer contacto com o exterior nem possibilidade de êxodo populacional através da construção, na madrugada de 12 para 13 de Agosto de 1961, do Muro de Berlim, sob o comando de Walter Ulbricht.
Berlim passa então a estar circunscrita por um muro de três metros, intransponível, que contém entre 60 a 250 quilómetros, consoante as versões ocidentais ou comunistas. Do lado de cá, torna-se necessário apoiar a isolada Berlim ocidental, pelo que John Kennedy se desloca à cidade e proclama o célebre discurso em que diz apaixonadamente "Ich bin ein Berliner!"
O segundo destes conflitos entre as duas potências ideológicas é a guerra da Coreia, onde além de conflito e tensão, houve efectivamente guerra. A Coreia é uma península asiática, cuja cultura é relativamente independente da China e do Japão. No início do séc. XX, o Japão anexa a Coreia em parte do seu território e assim fica até ao final da 2ª Guerra. Após o final da guerra, a Coreia recupera a independência mas surge a situação idêntica a outros pontos do globo, como a Grécia, em que a Norte o movimento de libertação é liderado pelos comunistas, apoiado pela União Soviética e China e a Sul pelos capitalistas, apoiados pelos americanos. Criam-se assim, também, dois exércitos libertadores com duas ideologias diferentes. Nessa altura fazem-se eleições e o povo decide qual o regime: porém no Norte ganham os comunistas e no sul os liberais, não se entendendo quanto a um consenso e criando uma situação insustentável de tensão entre dois governos: o do norte, comunista e coreano, o do sul, liberal e com presença efectiva dos americanos.
A 25 de Junho de 1950, os comunistas exigem a retirada dos americanos do território coreano e das suas tropas no sul. Uma vez que esta vontade não foi obedecida, os coreanos do norte iniciam investidas contra os americanos, empurrando-os para uma linha de defesa a sul, praticamente perdendo todo o território da Coreia. Como retaliação os americanos queixam-se na ONU contra a ofensiva, que designam como agressão do norte ao sul. A ONU pede esforços aos países para ajudar e no Conselho de Segurança é dado o apoio aos Estados Unidos. Isto, unicamente porque a União Soviética não está presente e a China é representada pela insignificante região de Taiwan, controlada pelos americanos. A ausência da Rússia, para os média, prende-se com um atraso no trânsito mas o que de facto aconteceu é que houve uma jogada política, em que a União Soviética imaginou que não estando presente, não seria nada decidido. Foi úm de dois únicos Conselhos de Segurança da ONU em que todos estiveram de acordo quanto a uma investida militar: o segundo foi já nos anos 90, quando Ieltsin concordou com Bush para a Guerra do Golfo.
Tomada a decisão por maioria no Conselho de Segurança da ONU, a jogada ocidental vence e a ONU envia os seus capacetes azuis para expulsar a Coreia do Norte do território que ocupou. Em 1950 e 51 as tropas da ONU, que eram constituídas apenas por americanos e alguns australianos "voluntários", começam a puxar os coreanos para o norte, a ponto de se aproximar da República Popular da China. Mao assusta-se com a proximidade dos americanos e ordena aos seus soldados, supostamente "voluntários" que vão ajudar os comunistas coreanos.
Pela primeira e única vez na História há um choque directo entre tropas chinesas e norte-americanas. E como a China não possui nesta altura a bomba atómica, McCarthy, general americano responsável, quer lançar na China a bomba atómica, facto que dificilmente deixaria a União Soviética quieta e que poderia assim ser o rastilho para a guerra atómica.
Em 1952, a guerra torna-se uma terrível crise, com os chineses a conseguirem empurrar os americanos cada vez mais para o Sul: não são tecnologicamente avançados mas são num número tão grande que conseguem derrotar os americanos. A 27 de Julho de 1953 cessa o combate e é assinado o armistício, dividindo as duas Coreias pelo paralelo 38, que ainda hoje as divide. Uma sob a alçada chinesa e soviética, a Norte, outra sob a alçada norte-americana, a sul. Hoje, a Coreia do Norte permanece um regime comunista, um dos regimes mais radicais do mundo; a Coreia do Sul é um dos países mais ricos e desenvolvidos do mundo, graças à ajuda americana. A ideia da união entre as Coreias era defendida por todas as partes tendo-se estudado esse molde até chegar George Bush e afastar a união da Coreia do Sul com um dos países do "eixo do mal".
A guerra da Coreia era no início uma guerra local mas com a ameaça atómica podia tornar-se um conflito mundial. Não se tornou porque o presidente Truman demitiu McCarthy, muito também por causa de um jogo entre eles, que se confrontaram nas eleições presidenciais.
O terceiro conflito deste período é a crise de Cuba. Cuba foi a primeira ilha colonial espanhola a ser povoada, a menina dos olhos da coroa para onde emigraram muitos galegos, principalmente. Trata-se de um território maior que Portugal e com cerca de 11 milhões de habitantes. Embora não possua muito petróleo, tem agricultura (tabaco, cana de açucar, rum) e turismo. No fim do séc. XIX dá-se uma guerra entre Espanha e os Estados Unidos por causa de Cuba: como habitualmente, os americanos instigam uma força qualquer à independência para depois a provocarem e lá se instalarem. Espanha e a sua "frota invencible" são derrotadas e os Estados Unidos passam a controlar Cuba, assim como muitos outros territórios na América Latina e Sul Asiático que perteceram aos espanhóis. Surge depois a discussão sobre se deveria Cuba ser integrada nos Estados Unidos mas optam por oficialmente não incluir o país, embora enviem exército e obriguem o governo provisório local a autorizar a intervenção americana sempre que estes assim o desejem.
Cuba torna-se assim o "bordel" dos americanos, com bom clima, muito rum, charutos e o controlo total de qualquer resistência à ocupação americana. Porém, nos anos 50, devido à desastrosa e odiada governação de Urgencio Baptista, uma força levanta-se contra ele, liderada por Fidel Castro e "Che" Ernesto Guevara. Fidel consegue, com o apoio de toda a população, destruir o detestado regime de Baptista e entra triunfalmente em Havana, depois de uma breve luta com 80 homens na Sierra Maestra. Isto acontece na noite de Ano Novo, de 58 para 59, enquanto os governantes pró-americanos comemoravam o Ano Novo: a partir de 1 de Janeiro de 1959 começa uma nova governação em Cuba.
A partir de então começa a nacionalização de propriedade americana, facto que leva à revolta dos Estados Unidos e a uma investida militar, a Baía dos Porcos, onde os americanos saem vergonhosamente derrotados. Fidel Castro derrota a invasão da Baía dos Porcos e há várias histórias e teorias sobre a preparação desse golpe, de ambos os lados. Os americanos contavam com o apoio dos cubanos mas a verdade é que naquela altura estavam todos ao lado de Fidel. Este pede ajuda à União Soviética, proclamando só aqui a adopção da doutrina marxista. Este pedido cai como uma luva nas intenções da União Soviética: tempos antes os Estados Unidos haviam montado misseis na Turquia apontados à União Soviética- esta será a hipótese da URSS colocar agora mísseis perto do território americano, em Cuba.
A 22 de Outubro de 1962, Kennedy descobre através de aviões espia que a URSS tem mísseis com ogivas nucleares em Cuba e faz um ultimato: ou retiram o arsenal de guerra de Cuba ou os Estados Unidos vão atacar. Antes da URSS responder, foram dez dias de suspense que mudaram o mundo. Tratou-se de uma situação verdadeiramente dramática, de verdadeira crise, em que não se sabe o que vai acontecer. A 28 de Outubro de 1962, os soviéticos iniciam a desmontagem dos seus mísseis em Cuba, com a contrapartida dos americanos desmontarem os seus mísseis na Turquia e em Itália. Ainda hoje não se sabe bem quem ganhou esta crise...
Sabe-se sim que a partir de então estabelece-se o famoso "telefone vermelho" entre o presidente soviético e o americano, apelidado de "hotline": isto porque se compreende que a origem desta crise foi muito em parte devido à falta de comunicação entre os dois estados, apenas uma guerra rígida, em que se imagina que ambos os estados possuem um "botão vermelho" capaz de acabar com a Humanidade.
No período da guerra rígida, duas personalidades destacam-se de cada um dos polos ideológicos: John Kennedy, do lado americano e Nikita Khruchtchev, do lado soviético.
John Kennedy nasceu em 1917 e foi assassinado em 1963, em Dallas. Estudou em Harvard, foi um herói da 2ª Guerra em batalhas no Pacífico e provém de uma família abastada. Líder dos democratas, foi o mais jovem presidente americano, com apenas 43 anos. Era um homem jovem, bonito, bom aluno, com um casamento exemplar com uma mulher igualmente bonita, Jackie Kennedy e com fama de sedutor entre as mulheres, entre as quais Marilyn Monroe. Era também o primeiro presidente católico, o que desperta tensão entre os protestantes, que começam a imaginar se não será um avanço do Papa nos EUA. Ganha as eleições sem se esperar, muito por causa de um famoso debate televisivo, onde se consta que Kennedy utilizou a televsião para se aproveitar do seu aspecto em detrimento de Nixon e assim superá-lo.
Seja como for, Kennedy foi um político fraco. A sua principal inovação, a "nova fronteira" era uma política interna de acção social que por estar vagamente definida, fracassou e nunca foi realizada. Externamente, promoveu a "Aliança para o Progresso" com vista a resolver os inúmeros conflitos na América Latina, onde tinham sido instaladas ditaduras de direita patrocinadas pelos EUA e suas empresas. Foi Kennedy que começou, também, a Guerra do Vietname. Trata-se assim de uma governação desastrosa- o ícone de mito fica só para a História porque Kennedy foi assassinado e porque era duro com os soviéticos. Porém, tudo o que fez falhou e nem do ponto de vista pessoal parecia ter, volvidos os anos, algum interesse. Kennedy conduziu a crise de Cuba e como era um político inexperiente falhou ao lançar um ultimato e colocar assim o mundo inteiro em risco. Ainda se desconhece oficialmente quem o matou e hoje é um símbolo nos Estados Unidos, principalmente pela sua resistência e dureza com os comunistas.
Do lado soviético, sobressai Nikita Kruchtchev, que nasceu em 1894, na Ucrânia e morreu em 1971, em Moscovo. Nikita é filho do proletariado russo, subiu na lista do Partido e não possuía grande instrução e de todo não tinha maneiras refinadas nem regras de etiqueta. Depois da morte de Lenin, em 1953, ganha a guerra pela liderança do Partido Comunista da URSS e é eleito no 20º Congresso do partido, secretário geral e por conseguinte líder da URSS. Num famoso discurso, Nikita denuncia os crimes que Stalin cometeu, acusando-o de genocídio com as suas deslocações de camponeses. Se com esta denúncia se torna muito popular no Ocidente, torna-se impopular entre as camadas conservadoras do PCUS, que vêm nele um embaraço para os soviéticos e nas suas reformas uma ameaça ao comunismo.
Entre outras coisas, Nikita tinha atitudes grosseiras de interromper líderes de estado para os insultar, tendo chegado a tirar os sapatos e a batê-los na mesa de discussão do Conselho de Segurança da ONU, esfregado uma bota na cara de Mao ou tecido comentários racistas sobre os búlgaros na presença do representante búlgaro. Não era, assim, o líder soviético típico. Sabia porém utilizar bem o poder da televisão e manipulá-la para os seus interesses. Embora não tivesse grandes conhecimentos do mundo exterior, foi convidado a visitar os Estados Unidos, onde chegou a discursar, tornando-se muito popular no Ocidente. Era impetuoso, voluntarioso e como recuou na crise de Cuba e como queria impor algumas reformas, foi afastado passados dois anos da liderança soviética.
Em suma, no decorrer da guerra rígida, dão-se os conflitos de Berlim, Coreia e Cuba. Este último resultou num bloqueio naval dos Estados Unidos a Cuba que dura até hoje, não permintindo que nada entre na ilha via marítima. Barack Obama promete uma negociação com os cubanos.
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CP - Aula 2
I - INTRODUÇÃO
1.1. Considerações gerais sobre política
1.2. Enquadramento teórico-conceptual
Em ciência política, o objecto de estudo, a política, é uma área "tão louvável quanto trabalhar noutra área qualquer do conhecimento". O termo política tem a ele associado, por vezes, um carácter pejorativo que é preciso esquecer no estudo de ciência política. Aqui, o objecto de investigação é tradicional, designado no início por estado e mais tarde, no século XX e com o advento de novos métodos que predominam na política e com o lançamento em 1953 do livro "Political System", o objecto de estudo passa a ser o sistema político, com instituições e leis de funcionamento dessas instituições segundo regras democráticas e valores orientadores. A partir de 1953, o objecto de investigação da Ciência Política passa assim a ser o sistema político, com os seus subsistemas (judiciários, territoriais, partidários, etc.).
Por exemplo no caso português, o sistema político português é democrático, uma vez que as instituições são eleitas pelo povo com regras democráticas de uma competição normal e orientadas com o valor máximo da liberdade. É, por isso, um sistema liberal democrático.
Já no que toca ao regime político, o termo vem do Direito e fala-se de um estado de direito: as instituições e regras de funcionamento regem-se pela constituição que é a lei máxima do estado.
A política em si tem a ver com o governo, a gestão, governação das situações sociais. Por situação social entende-se qualquer actividade humana que tenha uma organização: por exemplo o ensino. A política não organiza tudo mas pouca coisa escapa à sua organização. Não existe desde sempre por isso é possível, e alguns autores como Marx falam disso, que deixe um dia de existir.
A política organiza a sociedade através do poder. Este é a capacidade de uma pessoa ou grupo exercer influência sobre outra ou outro. Trata-se, segundo o senso-comum, de uma situação em que "um manda e outro obedece", uma situação social em que isto acontece de forma constante. A obediência, porém, é voluntária e utilitária em política.
Quanto ao poder, este divide-se em três. O poder político é imposto pela força, ameaça de força ou a sua própria utilização. Obedecemos a um governo através da lei presente na Constituição: obedecemos pagando impostos, com a contrapartida de poder usufruir de alguns serviços. No fim, obedecemos porque achamos que assim a sociedade é melhor e funciona melhor. Em segundo lugar, o poder económico, em que a pessoa obedece a determinado facto porque tira daí uma contrapartida económica, geralmente um salário. E por fim o poder ideológico, onde a obediência é conseguida por uma relação afectiva, carismática (religião, partido, etc.)
Assim a política organiza a sociedade exercendo poder e levando os outros a obedecê-lo.
O pai da política contemporânea é Max Weber, um dos primeiros clássicos explicadores da política. Provém de uma família abastada, é protestante e trabalhou como jornalista para o "Frankfurter Zeitung", criticando o Kaiser. Foi um dos criadores da Alemanha de Weimar, depois da I Guerra Mundial. É ele o fundador da Sociologia, ciência que investiga o indivíduo e os grupos, a integração do indivíduo no grupo, as suas regras, etc. Max Weber defende que a essência da Sociologia é a acção social. Tudo decorrente de um acto (como por exemplo um choque entre dois ciclistas) é acção social. A essência da acção social é a motivação, ou seja, no caso dos ciclistas, é a pergunta "porque aconteceu e quem motivou o choque?" O homem participa neste processo segundo a sua razão e a sua capacidade de racionalizar. A racionalização é o principal processo no Ocidente: tudo o que se faz tem que ter fundamento na racionalização.
O pensamento de Max Weber sobre o poder prende-se com o facto deste afirmar que o poder é um fenómeno quase total, difundido na sociedade e ao qual pouco escapa. Afirma também a existência de três situações puras de poder. Em primeiro lugar o poder legal, de obediência, fundamenta-se da legitimidade do poder jurídico: a fonte de obediência é a lei, os sujeitos são os que obedecem e também os que mandam. O governo organiza assim a sociedade prevendo o que é permitido e o que é punido, sendo a Constituição a ordem jurídica máxima, seguida das leis e dos decretos-lei. O segundo é o poder tradicional, que trata de algo que ao longo do tempo se tornou costume: é o poder da tradição, uma vez que estas leis não aparecem escritas. É o poder antecessor à lei da Constituição e embora seja uma lei alterada e arbitrária há algumas regras que se repetem e se tornam aceites. É o caso do Reino Unido, onde não existe uma Constituição mas sim leis baseadas na "tradition". Por fim, o terceiro poder é o carismático, onde a obediência é conseguida pela dedicação afectiva a uma pessoa: o carisma consegue-se quando se demonstra qualidades excepcionais (heróis, profetas, bruxos, líderes, etc.)
A tipologia dos poderes evolui e hoje fala-se, como vimos, de um poder político, outro económico e outro ideológico. Fala-se de um quarto poder, a comunicação social, pela influência que causa nas grandes massas do público.
Porém, todos os poderes convergem por natureza ao poder político, que é aquele que tem maior capacidade de obter obediência.
A democraticidade de uma sociedade mede-se pela separação dos poderes. Dividir o poder é garantia de liberdades e de limitação desses mesmos poderes. Esta é uma ideia antiga que provém de Aristóteles, que divide o poder em deliberatura, comando e judiciário e Hegel, que no princípio do séc. XVIII divide o poder em legislativo, executivo e o poder do príncipe. Montesquieu escreve em 1748 "O Espírito das Leis" e torna-se, ainda hoje, o mentor da divisão dos poderes: diz que a única maneira de limitar a monarquia absoluta é dividir o seu poder em vários sectores, o poder legislativo da assembleia, o poder executivo do governo e o poder civil, ou judicial, que diz que cada pessoa é um cidadão com direitos e deveres. A Revolução Francesa vem separar finalmente os poderes e atribuir liberdades ao homem (enquanto ser interior) e ao cidadão (enquanto detentor de direitos e deveres).
A primeira constituição escrita surge nos Estados Unidos, em 1781, com 25 artigos que sofreram algumas emendas ao longo da História. É uma das Constituições mais curtas e generalistas do mundo. A partir de então, torna-se costume dividir os poderes e em todos os estados democráticos actuais esses poderes estão separados. Por exemplo, em Portugal não se pode ser juíz e deputado ou ministro e juíz: as competências e poderes estão separados.
Em primeiro lugar, o poder legislativo. É o que trata das leis, no Parlamento, que pode ter uma ou duas câmaras. O Parlamento é eleito directamente pelo povo e é a instituição máxima da soberania do estado. Aí discute-se e aprovam-se as leis, ou seja, decidem-se as regras de comportamento em sociedade.
Em segundo lugar, o poder executivo, responsável por executar as leis definidas pelo Parlamento. É o governo, com os seus ministérios, secretarias, direcções, etc, e os seus funcionários públicos, que fazem com que a máquina do estado funcione.
Em terceiro lugar, o poder judicial, que tem o poder para dizer quem está certo quando há alguma dúvida quanto a isso. São os tribunais, cujas decisões somos obrigados a respeitar.
Em resumo, a política comanda a organização da sociedade em consonância com os cidadãos. Estes decidem quais são as regras e obedecem-nas, natural e democraticamente. A divisão entre os poderes permite o controlo do próprio poder e a democracia. Importa neste ponto referir que a democracia é uma forma de organizar a sociedade mas não uma ideologia. A democracia é uma forma de poder, de organizar o estado que se opôe ao totalitarismo.
Quanto à ideologia, esta pode ser encarada no seu sentido forte ou fraco. Do primeiro ponto de vista, refere-se a Marx, que diz que a religião é o ópio do povo e como tal aponta a ideologia como uma forma de subordinar a classe operária, uma forma de enganar e controlar a maioria. Do segundo ponto de vista, aquele que estudamos, ideologia é um conjunto de crenças, propostas e decisões de como organizar a sociedade. Por exemplo, o Liberalismo, que organiza a sociedade segundo crenças nas liberdades individuais, economia de mercado, propriedade privada, etc. Cada ideologia propôe, assim, exemplos práticos de como organizar a sociedade.
Francis Fukuyama, professor universitário norte-americano, publicou em 1989 um artigo intitulado "Fim da História" em que refere que após a queda do Muro de Berlim, as ideologias morreram: depois da queda do muro caíu também o comunismo e como tal termina o choque de ideologias, uma vez que só fica o liberalismo, reinante. Como a História é uma luta ideológica constante, uma vez que passa a só haver uma ideologia, termina também a História. É esta a ideia exposta por Fukuyama no seu livro de 1993 "Fim da História e o Último Homem". Adianta ainda que sendo o Liberalismo e a Democracia por natureza pacíficos, não haverá mais guerras e vai chegar ao ponto em que um homem super evoluído não quererá mais guerrear.
Esta ideia foi recolhida com agrado pelos Estados Unidos, que passam a ser assim os líderes desta nova ordem mundial onde governa o Liberalismo e em nome da Paz e da liberdade justificam uma política externa de agressão: as guerras passam por estes a ser justificadas com razões humanistas.
Passados dez anos do livro de Fukuyama, com os conflitos na Jugoslávia e Médio Oriente, vemos que este estava redondamente enganado. A guerra continua a existir e a ser feita por motivos pouco nobres, que em nada têm a ver com a propagação da Paz e das liberdades.
Outra teoria que se aceitou foi a de Samuel P. Huntington, no seu livro "O Choque das Civilizações". Huntington refere que depois da queda do muro, a identidade ideológica desapareceu e mesmo do ponto de vista económico desapareceu a economia porque esta necessita de um grande espaço para sobreviver, que foi perdido. Assim, fala de civilizações como recuperadoras desse espaço, onde as pessoas partilham valores que lhes interessam. Huntington refere a civilização ocidental, cristã, baseada nos Direitos do Homem e na economia de mercado e liderada pelos Estados Unidos; a civilização ortodoxa, liderada pela Rússia, com uma interpretação diferente do Cristianismo e mais totalitária; a civilização hindu, chinesa, da África negra, latina e por fim a civilização muçulmana, baseada no Islão, sem um país líder definido. Uma vez que as civilizações são um ponto de encontro de pessoas e economias diferentes, estas entram em choque entre si. Foi baseado nesta premissa que George W. Bush decide afirmar que a civilização muçulmana já entrou em choque com a ocidental, procurando assim justificação para as suas ofensivas militares.
Contudo, quer um quer outro estão errados. As ideologias continuam bem vivas, como se assiste agora, com o neoliberalismo desenfreado dos últimos anos a produzir uma grave crise do Liberalismo e a provocar uma profunda discussão ideológica. A ideologia irá sempre continuar viva, não se sabe é entre que opostos esta vai funcionar. Hoje em dia, fala-se apenas de uma dialéctica entre esquerda e direita e entre estas e o totalitarismo. À direita pertence o Liberalismo (centro direita), o Conservadorismo e a Direita Extrema. À esquerda, todas as divisões se situam mais perto ou mais longe da doutrina de Marx: Socialismo, Comunismo, Anarquismo, Maoísmo, Estalisnismo, Trotskismo, etc...
Começando com a Direita, e com o Liberalismo. Trata-se de uma ideologia intimamente ligada à burguesia e ao capitalismo. A burguesia provém do francês "bourg" que designa cidade pois tratava-se de trabalhadores que moravam frequentemente nos burgos. É utilizada aqui com um sentido neutro, de uma classe que liderou o processo de destruição do Antigo Regime. A burguesia lutou pela Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Liberdade para os oprimidos mas sobretudo liberdade para poderem produzir o que queriam sem pedir autorização ao monarca e fazer circular os seus produtos, para assim enriquecer. Igualdade entre todas as classes, de forma a que todos paguem impostos e não apenas os trabalhadores: dessa forma haveria mais dinheiro de investimento e a nobreza empobrecia. Fraternidade num vislumbramento da justiça social. A burguesia traz assim o quadro liberalista como ideologia. Traz também o capitalismo enquanto forma de economia. O capital é tudo o que pode servir de moeda de troca e pode ser móvel ou imóvel. O Antigo Regime não permite a liberdade de capital pelo que a burguesia a impôe.
O Liberalismo tem três ideias profundas, no sentido de anular o Antigo Regime. São elas o naturalismo hedonista, o racionalismo e o individualismo. O primeiro diz respeito ao facto de estarmos na vida terrena e de ser aqui que devemos buscar o prazer: a vida é para usufruir, para se gastar e ter prazer com isso. Esta alegria consumista de viver entra em choque com a ideia cristã de que a vida é "um vale de lágrimas". O racionalismo prende-se com o Iluminismo e a sua explicação do mundo através da Razão: o Homem é capaz por si só de perceber tudo e está livre para o fazer. O individualismo, por fim, instala uma sociedade em que cada um trata de si e da sua vida, fazendo-o da forma que melhor entende e não sob a alçada do monarca.
No que toca à liberdade propriamente dita, esta divide-se em quatro estilos de liberdades. Em primeiro lugar, a liberdade natural, que proclama que o homem aparece livre na Natureza. Thomas Hobbes, filósofo britânico, apoia-se em "Leviathan" para referir que o homem é fraco e medroso na Natureza, precisando para isso de acumular bens de forma a sentir-se mais seguro. A luta pelos bens está patente já na expressão latina "homo homini lupus": para o homem, o homem é um lobo. No entanto, segundo Hobbes isto pode ser ultrapassado se houver lei, se houver uma força que nos obrigue a ter um comportamento pacífico. Desta forma, a verdadeira liberdade é quando nos toleramos e nos organizamos de forma a respeitarmo-nos: sem lei, a luta de todos contra todos é permanente.
A liberdade racional, por seu turno, baseia-se em Hegel. Hegel, que entre muitas outras coisas afirma que é no resto positivo das guerras que a Humanidade avança, diz sobre a liberdade que a essência do homem é o desejo. Esse desejo desenfreado pode ser controlado através da lei, limitando-o a não roubar o outro. Assim, segundo Hegel, a verdadeira liberdade é limitar a liberdade e consegue-se através da racionalização, que nos permite controlar o desejo: racionalizando conseguimos assim controlar tudo.
A liberdade libertadora é uma auto-emancipação: o homem aprende e aprendendo coisas vai evoluindo e desse forma tornando-se mais seguro, mais satisfeito. Quanto mais satisfeito e seguro, mais controlador de si próprio e desta forma mais livre. Assim, esta liberdade diz que quanto mais se conhece, mais livre se está.
Por fim, a liberdade sexual. O desejo sexual é um dos mais fortes no homem, que nasce inconscientemente com ele e nunca acaba. Nos anos 70, Sontag publica um livro que origina a luta pela liberdade sexual da mulher. Daí surge um movimento que revoluciona toda a forma de pensar a liberdade sexual e tenta institui-la nas escolas, lutando contra os mais conservadores. Trata-se de uma ideia que libertou muito as tensões existentes entre o homem e a mulher e entre eles próprios mas que desembocou na pornografia, que deixa de ser liberdade para passar a ser perversão.
1.1. Considerações gerais sobre política
1.2. Enquadramento teórico-conceptual
Em ciência política, o objecto de estudo, a política, é uma área "tão louvável quanto trabalhar noutra área qualquer do conhecimento". O termo política tem a ele associado, por vezes, um carácter pejorativo que é preciso esquecer no estudo de ciência política. Aqui, o objecto de investigação é tradicional, designado no início por estado e mais tarde, no século XX e com o advento de novos métodos que predominam na política e com o lançamento em 1953 do livro "Political System", o objecto de estudo passa a ser o sistema político, com instituições e leis de funcionamento dessas instituições segundo regras democráticas e valores orientadores. A partir de 1953, o objecto de investigação da Ciência Política passa assim a ser o sistema político, com os seus subsistemas (judiciários, territoriais, partidários, etc.).
Por exemplo no caso português, o sistema político português é democrático, uma vez que as instituições são eleitas pelo povo com regras democráticas de uma competição normal e orientadas com o valor máximo da liberdade. É, por isso, um sistema liberal democrático.
Já no que toca ao regime político, o termo vem do Direito e fala-se de um estado de direito: as instituições e regras de funcionamento regem-se pela constituição que é a lei máxima do estado.
A política em si tem a ver com o governo, a gestão, governação das situações sociais. Por situação social entende-se qualquer actividade humana que tenha uma organização: por exemplo o ensino. A política não organiza tudo mas pouca coisa escapa à sua organização. Não existe desde sempre por isso é possível, e alguns autores como Marx falam disso, que deixe um dia de existir.
A política organiza a sociedade através do poder. Este é a capacidade de uma pessoa ou grupo exercer influência sobre outra ou outro. Trata-se, segundo o senso-comum, de uma situação em que "um manda e outro obedece", uma situação social em que isto acontece de forma constante. A obediência, porém, é voluntária e utilitária em política.
Quanto ao poder, este divide-se em três. O poder político é imposto pela força, ameaça de força ou a sua própria utilização. Obedecemos a um governo através da lei presente na Constituição: obedecemos pagando impostos, com a contrapartida de poder usufruir de alguns serviços. No fim, obedecemos porque achamos que assim a sociedade é melhor e funciona melhor. Em segundo lugar, o poder económico, em que a pessoa obedece a determinado facto porque tira daí uma contrapartida económica, geralmente um salário. E por fim o poder ideológico, onde a obediência é conseguida por uma relação afectiva, carismática (religião, partido, etc.)
Assim a política organiza a sociedade exercendo poder e levando os outros a obedecê-lo.
O pai da política contemporânea é Max Weber, um dos primeiros clássicos explicadores da política. Provém de uma família abastada, é protestante e trabalhou como jornalista para o "Frankfurter Zeitung", criticando o Kaiser. Foi um dos criadores da Alemanha de Weimar, depois da I Guerra Mundial. É ele o fundador da Sociologia, ciência que investiga o indivíduo e os grupos, a integração do indivíduo no grupo, as suas regras, etc. Max Weber defende que a essência da Sociologia é a acção social. Tudo decorrente de um acto (como por exemplo um choque entre dois ciclistas) é acção social. A essência da acção social é a motivação, ou seja, no caso dos ciclistas, é a pergunta "porque aconteceu e quem motivou o choque?" O homem participa neste processo segundo a sua razão e a sua capacidade de racionalizar. A racionalização é o principal processo no Ocidente: tudo o que se faz tem que ter fundamento na racionalização.
O pensamento de Max Weber sobre o poder prende-se com o facto deste afirmar que o poder é um fenómeno quase total, difundido na sociedade e ao qual pouco escapa. Afirma também a existência de três situações puras de poder. Em primeiro lugar o poder legal, de obediência, fundamenta-se da legitimidade do poder jurídico: a fonte de obediência é a lei, os sujeitos são os que obedecem e também os que mandam. O governo organiza assim a sociedade prevendo o que é permitido e o que é punido, sendo a Constituição a ordem jurídica máxima, seguida das leis e dos decretos-lei. O segundo é o poder tradicional, que trata de algo que ao longo do tempo se tornou costume: é o poder da tradição, uma vez que estas leis não aparecem escritas. É o poder antecessor à lei da Constituição e embora seja uma lei alterada e arbitrária há algumas regras que se repetem e se tornam aceites. É o caso do Reino Unido, onde não existe uma Constituição mas sim leis baseadas na "tradition". Por fim, o terceiro poder é o carismático, onde a obediência é conseguida pela dedicação afectiva a uma pessoa: o carisma consegue-se quando se demonstra qualidades excepcionais (heróis, profetas, bruxos, líderes, etc.)
A tipologia dos poderes evolui e hoje fala-se, como vimos, de um poder político, outro económico e outro ideológico. Fala-se de um quarto poder, a comunicação social, pela influência que causa nas grandes massas do público.
Porém, todos os poderes convergem por natureza ao poder político, que é aquele que tem maior capacidade de obter obediência.
A democraticidade de uma sociedade mede-se pela separação dos poderes. Dividir o poder é garantia de liberdades e de limitação desses mesmos poderes. Esta é uma ideia antiga que provém de Aristóteles, que divide o poder em deliberatura, comando e judiciário e Hegel, que no princípio do séc. XVIII divide o poder em legislativo, executivo e o poder do príncipe. Montesquieu escreve em 1748 "O Espírito das Leis" e torna-se, ainda hoje, o mentor da divisão dos poderes: diz que a única maneira de limitar a monarquia absoluta é dividir o seu poder em vários sectores, o poder legislativo da assembleia, o poder executivo do governo e o poder civil, ou judicial, que diz que cada pessoa é um cidadão com direitos e deveres. A Revolução Francesa vem separar finalmente os poderes e atribuir liberdades ao homem (enquanto ser interior) e ao cidadão (enquanto detentor de direitos e deveres).
A primeira constituição escrita surge nos Estados Unidos, em 1781, com 25 artigos que sofreram algumas emendas ao longo da História. É uma das Constituições mais curtas e generalistas do mundo. A partir de então, torna-se costume dividir os poderes e em todos os estados democráticos actuais esses poderes estão separados. Por exemplo, em Portugal não se pode ser juíz e deputado ou ministro e juíz: as competências e poderes estão separados.
Em primeiro lugar, o poder legislativo. É o que trata das leis, no Parlamento, que pode ter uma ou duas câmaras. O Parlamento é eleito directamente pelo povo e é a instituição máxima da soberania do estado. Aí discute-se e aprovam-se as leis, ou seja, decidem-se as regras de comportamento em sociedade.
Em segundo lugar, o poder executivo, responsável por executar as leis definidas pelo Parlamento. É o governo, com os seus ministérios, secretarias, direcções, etc, e os seus funcionários públicos, que fazem com que a máquina do estado funcione.
Em terceiro lugar, o poder judicial, que tem o poder para dizer quem está certo quando há alguma dúvida quanto a isso. São os tribunais, cujas decisões somos obrigados a respeitar.
Em resumo, a política comanda a organização da sociedade em consonância com os cidadãos. Estes decidem quais são as regras e obedecem-nas, natural e democraticamente. A divisão entre os poderes permite o controlo do próprio poder e a democracia. Importa neste ponto referir que a democracia é uma forma de organizar a sociedade mas não uma ideologia. A democracia é uma forma de poder, de organizar o estado que se opôe ao totalitarismo.
Quanto à ideologia, esta pode ser encarada no seu sentido forte ou fraco. Do primeiro ponto de vista, refere-se a Marx, que diz que a religião é o ópio do povo e como tal aponta a ideologia como uma forma de subordinar a classe operária, uma forma de enganar e controlar a maioria. Do segundo ponto de vista, aquele que estudamos, ideologia é um conjunto de crenças, propostas e decisões de como organizar a sociedade. Por exemplo, o Liberalismo, que organiza a sociedade segundo crenças nas liberdades individuais, economia de mercado, propriedade privada, etc. Cada ideologia propôe, assim, exemplos práticos de como organizar a sociedade.
Francis Fukuyama, professor universitário norte-americano, publicou em 1989 um artigo intitulado "Fim da História" em que refere que após a queda do Muro de Berlim, as ideologias morreram: depois da queda do muro caíu também o comunismo e como tal termina o choque de ideologias, uma vez que só fica o liberalismo, reinante. Como a História é uma luta ideológica constante, uma vez que passa a só haver uma ideologia, termina também a História. É esta a ideia exposta por Fukuyama no seu livro de 1993 "Fim da História e o Último Homem". Adianta ainda que sendo o Liberalismo e a Democracia por natureza pacíficos, não haverá mais guerras e vai chegar ao ponto em que um homem super evoluído não quererá mais guerrear.
Esta ideia foi recolhida com agrado pelos Estados Unidos, que passam a ser assim os líderes desta nova ordem mundial onde governa o Liberalismo e em nome da Paz e da liberdade justificam uma política externa de agressão: as guerras passam por estes a ser justificadas com razões humanistas.
Passados dez anos do livro de Fukuyama, com os conflitos na Jugoslávia e Médio Oriente, vemos que este estava redondamente enganado. A guerra continua a existir e a ser feita por motivos pouco nobres, que em nada têm a ver com a propagação da Paz e das liberdades.
Outra teoria que se aceitou foi a de Samuel P. Huntington, no seu livro "O Choque das Civilizações". Huntington refere que depois da queda do muro, a identidade ideológica desapareceu e mesmo do ponto de vista económico desapareceu a economia porque esta necessita de um grande espaço para sobreviver, que foi perdido. Assim, fala de civilizações como recuperadoras desse espaço, onde as pessoas partilham valores que lhes interessam. Huntington refere a civilização ocidental, cristã, baseada nos Direitos do Homem e na economia de mercado e liderada pelos Estados Unidos; a civilização ortodoxa, liderada pela Rússia, com uma interpretação diferente do Cristianismo e mais totalitária; a civilização hindu, chinesa, da África negra, latina e por fim a civilização muçulmana, baseada no Islão, sem um país líder definido. Uma vez que as civilizações são um ponto de encontro de pessoas e economias diferentes, estas entram em choque entre si. Foi baseado nesta premissa que George W. Bush decide afirmar que a civilização muçulmana já entrou em choque com a ocidental, procurando assim justificação para as suas ofensivas militares.
Contudo, quer um quer outro estão errados. As ideologias continuam bem vivas, como se assiste agora, com o neoliberalismo desenfreado dos últimos anos a produzir uma grave crise do Liberalismo e a provocar uma profunda discussão ideológica. A ideologia irá sempre continuar viva, não se sabe é entre que opostos esta vai funcionar. Hoje em dia, fala-se apenas de uma dialéctica entre esquerda e direita e entre estas e o totalitarismo. À direita pertence o Liberalismo (centro direita), o Conservadorismo e a Direita Extrema. À esquerda, todas as divisões se situam mais perto ou mais longe da doutrina de Marx: Socialismo, Comunismo, Anarquismo, Maoísmo, Estalisnismo, Trotskismo, etc...
Começando com a Direita, e com o Liberalismo. Trata-se de uma ideologia intimamente ligada à burguesia e ao capitalismo. A burguesia provém do francês "bourg" que designa cidade pois tratava-se de trabalhadores que moravam frequentemente nos burgos. É utilizada aqui com um sentido neutro, de uma classe que liderou o processo de destruição do Antigo Regime. A burguesia lutou pela Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Liberdade para os oprimidos mas sobretudo liberdade para poderem produzir o que queriam sem pedir autorização ao monarca e fazer circular os seus produtos, para assim enriquecer. Igualdade entre todas as classes, de forma a que todos paguem impostos e não apenas os trabalhadores: dessa forma haveria mais dinheiro de investimento e a nobreza empobrecia. Fraternidade num vislumbramento da justiça social. A burguesia traz assim o quadro liberalista como ideologia. Traz também o capitalismo enquanto forma de economia. O capital é tudo o que pode servir de moeda de troca e pode ser móvel ou imóvel. O Antigo Regime não permite a liberdade de capital pelo que a burguesia a impôe.
O Liberalismo tem três ideias profundas, no sentido de anular o Antigo Regime. São elas o naturalismo hedonista, o racionalismo e o individualismo. O primeiro diz respeito ao facto de estarmos na vida terrena e de ser aqui que devemos buscar o prazer: a vida é para usufruir, para se gastar e ter prazer com isso. Esta alegria consumista de viver entra em choque com a ideia cristã de que a vida é "um vale de lágrimas". O racionalismo prende-se com o Iluminismo e a sua explicação do mundo através da Razão: o Homem é capaz por si só de perceber tudo e está livre para o fazer. O individualismo, por fim, instala uma sociedade em que cada um trata de si e da sua vida, fazendo-o da forma que melhor entende e não sob a alçada do monarca.
No que toca à liberdade propriamente dita, esta divide-se em quatro estilos de liberdades. Em primeiro lugar, a liberdade natural, que proclama que o homem aparece livre na Natureza. Thomas Hobbes, filósofo britânico, apoia-se em "Leviathan" para referir que o homem é fraco e medroso na Natureza, precisando para isso de acumular bens de forma a sentir-se mais seguro. A luta pelos bens está patente já na expressão latina "homo homini lupus": para o homem, o homem é um lobo. No entanto, segundo Hobbes isto pode ser ultrapassado se houver lei, se houver uma força que nos obrigue a ter um comportamento pacífico. Desta forma, a verdadeira liberdade é quando nos toleramos e nos organizamos de forma a respeitarmo-nos: sem lei, a luta de todos contra todos é permanente.
A liberdade racional, por seu turno, baseia-se em Hegel. Hegel, que entre muitas outras coisas afirma que é no resto positivo das guerras que a Humanidade avança, diz sobre a liberdade que a essência do homem é o desejo. Esse desejo desenfreado pode ser controlado através da lei, limitando-o a não roubar o outro. Assim, segundo Hegel, a verdadeira liberdade é limitar a liberdade e consegue-se através da racionalização, que nos permite controlar o desejo: racionalizando conseguimos assim controlar tudo.
A liberdade libertadora é uma auto-emancipação: o homem aprende e aprendendo coisas vai evoluindo e desse forma tornando-se mais seguro, mais satisfeito. Quanto mais satisfeito e seguro, mais controlador de si próprio e desta forma mais livre. Assim, esta liberdade diz que quanto mais se conhece, mais livre se está.
Por fim, a liberdade sexual. O desejo sexual é um dos mais fortes no homem, que nasce inconscientemente com ele e nunca acaba. Nos anos 70, Sontag publica um livro que origina a luta pela liberdade sexual da mulher. Daí surge um movimento que revoluciona toda a forma de pensar a liberdade sexual e tenta institui-la nas escolas, lutando contra os mais conservadores. Trata-se de uma ideia que libertou muito as tensões existentes entre o homem e a mulher e entre eles próprios mas que desembocou na pornografia, que deixa de ser liberdade para passar a ser perversão.
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21/10/08
HPEC - Trabalho de Pesquisa
1- Problema
Pergunta que suscitou a reflexão: “Porque olhamos com receio para todos os países que possuem a bomba atómica, menos para o único que já por duas vezes a utilizou?”
A partir desta questão, surgiram outras. Juntas, constituem o problema encontrado para servir de base ao trabalho de pesquisa:
Quem são e porque são assim chamados os países que constituem o “eixo do mal” e os “bastiões da tirania”? Que tipos de regimes políticos (sobre)vivem nesses países e por que razão constituem um “ameaça global” ou são “violadores dos Direitos do Homem” os países assim classificados pelos Estados Unidos da América? Existirá dentro da sociedade americana alguma semelhança com aqueles países, de forma a que devamos também temê-la?
Pretendo fazer uma análise das definições impostas, das relações desses países no e com o mundo, as suas políticas e a evolução desde que foram incluídos por George W. Bush e Condoleeza Rice nos subgrupos considerados “patrocinadores do terrorismo” ou “tiranos”. Por fim, respondendo ainda de forma indirecta ao problema, pretendo confirmar, ou não, a hipótese de poderem existir semelhantes opressões no seio da nação que classificadora.
2- Objectivos
O objectivo inicial do meu trabalho passa por uma caracterização de um grupo de estados marginais às políticas liberalistas e à democracia. Essa caracterização será feita de forma sumária, incidindo sobre os aspectos políticos e económicos.
Em cada um desses estados, o meu objectivo principal, no entanto, é encontrar um tema político da actualidade para assim caracterizá-lo.
Depois, pretendo estabelecer uma análise comparativa, demonstrando a existência de pontos de fractura na sociedade norte-americana.
Para dar resposta às três questões centrais elaboradas na definição do problema, precisarei atingir os seguintes objectivos:
a) conseguir uma clara definição dos países inserido no “eixo do mal” e classificados como “bastiões da tirania”
b) chegar a uma razão objectiva para terem sido incluídos naquele grupo
c) caracterizar os regimes políticos vigentes naqueles estados
d) caracterizar sinteticamente o contexto social, histórico, demográfico, geográfico, etc. dos estados em questão
e) perceber os pontos chave presentes nesses estados que os faz tornarem-se “ameaças globais”
f) perceber a questão da violação dos Direitos do Homem nesses estados
g) pesquisar dentro da sociedade norte-americana por pontos de contacto entre esta e os estados classificados como “eixo do mal” e “bastiões da tirania”
3- Notas Metodológicas
Os temas relacionados com a forma como os Estados Unidos “tratam” os seus co-habitantes no planeta, são assuntos que desde que incluo as minhas pesquisas por áreas da política, me interessaram em grande escala. Seja por uma atitude neo-colonialista, pela obsessão pela propagação da mundialização ou pela forma como impõe rótulos a grupos de países, os Estados Unidos da América constituem obrigatoriamente um poder instalado sobre as outras nações e considero de todo o interesse estudar esse poder. Isto, porque estamos na Europa, podendo ser algo como um espaço neutral ou uma “ponte aérea” entre os Estados Unidos e os países por eles classificados com predicados tão pejorativos como “tiranos” ou “patrocinadores do mal”. De notar que, à excepção de Cuba, os Estados Unidos colocam estes países todos para lá da Europa, deixando de fora a Colômbia, a Venezuela, o Haiti, a Guiné Equatorial, a Gambia, Azerbaijão ou outros países que, segundo as definições, poderiam (ou não) ser integrados nos grupos que pretendo estudar. Haverá alguma razão para este distanciamento geográfico?
Por outro lado, os Estados Unidos deixam de fora a China. O que levou a que Condolezza Rice não quisesse incluir aquela ditadura comunista no seu leque de países “tiranos”? E a Rússia, após os incidentes de Agosto de 2008, deverá ou não ser vista pelos americanos como totalitária?
No seguimento de algumas pesquisas que efectuei informalmente, deparei com situações no próprio seio da comunidade norte-americana que me levaram a pensar se não estaria na presença de factores parecidos com aqueles que os próprios americanos criticam nos outros estados. Para além de Crystal City dos anos 40 ou de Guantanamo, existe um mundo de censuras, limitações, jogos de poder e coacção na sociedade norte-americana, que pretendo explorar um pouco na última parte do trabalho.
Todas estas perguntas e muitas mais que surgirão ao longo do trabalho tornam este assunto bastante interessante e pertinente, numa altura em que as relações entre os estados e as sociedades parecem alterar-se a cada semana que passa.
4- Fontes
A indicar oportunamente.
5- Índice (provisório)
1- Introdução
2- O “Eixo do Mal” de George W.Bush
a. Caracterização sócio-cultural do Irão, Iraque e Coreia do Norte
b. Os regimes políticos dos países do “Eixo do Mal”
c. O Irão e a ameaça presente
d. A questão do Iraque:
i. Os regimes políticos antes e depois da guerra
ii. Críticas à intervenção norte-americana no Iraque
e. A Coreia do Norte e a erradicação do nuclear
3- “Para além do Eixo do Mal”, de John R. Bolton:
a. Caracterização sócio-cultural de Cuba, Líbia e Síria
b. Os regimes políticos os países “Para além do Eixo do Mal”
4- “Os bastiões da tirania”, por Condoleezza Rice
a. Caracterização sócio-cultural da Bielorrúsia, Myanmar e Zimbawe
b. Os regimes políticos dos países “bastiões da tirania”
5- Os que ficam de fora das classificações
a. Os países americanos, africanos e asiáticos
b. A Rússia
c. A China
6- Os Estados Unidos: alguma razão para os temer?
7- Conclusão
Pergunta que suscitou a reflexão: “Porque olhamos com receio para todos os países que possuem a bomba atómica, menos para o único que já por duas vezes a utilizou?”
A partir desta questão, surgiram outras. Juntas, constituem o problema encontrado para servir de base ao trabalho de pesquisa:
Quem são e porque são assim chamados os países que constituem o “eixo do mal” e os “bastiões da tirania”? Que tipos de regimes políticos (sobre)vivem nesses países e por que razão constituem um “ameaça global” ou são “violadores dos Direitos do Homem” os países assim classificados pelos Estados Unidos da América? Existirá dentro da sociedade americana alguma semelhança com aqueles países, de forma a que devamos também temê-la?
Pretendo fazer uma análise das definições impostas, das relações desses países no e com o mundo, as suas políticas e a evolução desde que foram incluídos por George W. Bush e Condoleeza Rice nos subgrupos considerados “patrocinadores do terrorismo” ou “tiranos”. Por fim, respondendo ainda de forma indirecta ao problema, pretendo confirmar, ou não, a hipótese de poderem existir semelhantes opressões no seio da nação que classificadora.
2- Objectivos
O objectivo inicial do meu trabalho passa por uma caracterização de um grupo de estados marginais às políticas liberalistas e à democracia. Essa caracterização será feita de forma sumária, incidindo sobre os aspectos políticos e económicos.
Em cada um desses estados, o meu objectivo principal, no entanto, é encontrar um tema político da actualidade para assim caracterizá-lo.
Depois, pretendo estabelecer uma análise comparativa, demonstrando a existência de pontos de fractura na sociedade norte-americana.
Para dar resposta às três questões centrais elaboradas na definição do problema, precisarei atingir os seguintes objectivos:
a) conseguir uma clara definição dos países inserido no “eixo do mal” e classificados como “bastiões da tirania”
b) chegar a uma razão objectiva para terem sido incluídos naquele grupo
c) caracterizar os regimes políticos vigentes naqueles estados
d) caracterizar sinteticamente o contexto social, histórico, demográfico, geográfico, etc. dos estados em questão
e) perceber os pontos chave presentes nesses estados que os faz tornarem-se “ameaças globais”
f) perceber a questão da violação dos Direitos do Homem nesses estados
g) pesquisar dentro da sociedade norte-americana por pontos de contacto entre esta e os estados classificados como “eixo do mal” e “bastiões da tirania”
3- Notas Metodológicas
Os temas relacionados com a forma como os Estados Unidos “tratam” os seus co-habitantes no planeta, são assuntos que desde que incluo as minhas pesquisas por áreas da política, me interessaram em grande escala. Seja por uma atitude neo-colonialista, pela obsessão pela propagação da mundialização ou pela forma como impõe rótulos a grupos de países, os Estados Unidos da América constituem obrigatoriamente um poder instalado sobre as outras nações e considero de todo o interesse estudar esse poder. Isto, porque estamos na Europa, podendo ser algo como um espaço neutral ou uma “ponte aérea” entre os Estados Unidos e os países por eles classificados com predicados tão pejorativos como “tiranos” ou “patrocinadores do mal”. De notar que, à excepção de Cuba, os Estados Unidos colocam estes países todos para lá da Europa, deixando de fora a Colômbia, a Venezuela, o Haiti, a Guiné Equatorial, a Gambia, Azerbaijão ou outros países que, segundo as definições, poderiam (ou não) ser integrados nos grupos que pretendo estudar. Haverá alguma razão para este distanciamento geográfico?
Por outro lado, os Estados Unidos deixam de fora a China. O que levou a que Condolezza Rice não quisesse incluir aquela ditadura comunista no seu leque de países “tiranos”? E a Rússia, após os incidentes de Agosto de 2008, deverá ou não ser vista pelos americanos como totalitária?
No seguimento de algumas pesquisas que efectuei informalmente, deparei com situações no próprio seio da comunidade norte-americana que me levaram a pensar se não estaria na presença de factores parecidos com aqueles que os próprios americanos criticam nos outros estados. Para além de Crystal City dos anos 40 ou de Guantanamo, existe um mundo de censuras, limitações, jogos de poder e coacção na sociedade norte-americana, que pretendo explorar um pouco na última parte do trabalho.
Todas estas perguntas e muitas mais que surgirão ao longo do trabalho tornam este assunto bastante interessante e pertinente, numa altura em que as relações entre os estados e as sociedades parecem alterar-se a cada semana que passa.
4- Fontes
A indicar oportunamente.
5- Índice (provisório)
1- Introdução
2- O “Eixo do Mal” de George W.Bush
a. Caracterização sócio-cultural do Irão, Iraque e Coreia do Norte
b. Os regimes políticos dos países do “Eixo do Mal”
c. O Irão e a ameaça presente
d. A questão do Iraque:
i. Os regimes políticos antes e depois da guerra
ii. Críticas à intervenção norte-americana no Iraque
e. A Coreia do Norte e a erradicação do nuclear
3- “Para além do Eixo do Mal”, de John R. Bolton:
a. Caracterização sócio-cultural de Cuba, Líbia e Síria
b. Os regimes políticos os países “Para além do Eixo do Mal”
4- “Os bastiões da tirania”, por Condoleezza Rice
a. Caracterização sócio-cultural da Bielorrúsia, Myanmar e Zimbawe
b. Os regimes políticos dos países “bastiões da tirania”
5- Os que ficam de fora das classificações
a. Os países americanos, africanos e asiáticos
b. A Rússia
c. A China
6- Os Estados Unidos: alguma razão para os temer?
7- Conclusão
HMC - Aula 7
V - GUERRA FRIA
5.1. Noção de Guerra Fria
5.2. Inicio da Guerra Fria ("Golpe de Praga")
5.3. Formação dos blocos ideológicos, económicos e militares
Após o final da II Guerra Mundial e com a derrota do Nazismo-Fascismo em todo o mundo, começam a aumentar as diferenças entre os dois blocos ideológicos restantes e vencedores da guerra, o bloco ocidental, constituídos pelos liberais capitalistas e o bloco de leste, constituído pelos socialistas comunistas. Esta tensão entre os dois é de tal ordem que Churchill, numa conferência em Zurique, chega a falar de uma "cortina de ferro" que separa o mundo capitalista do mundo comunista, tais são as diferenças ideológicas que os separam. Trata-se, assim, do nascimento de uma situação que se prolongará até ao início dos anos 90 e que ficará conhecida para a História como o período de Guerra Fria entre o Ocidente e o Leste. Guerra porque há um corte total das relações diplomáticas entre os dois blocos e fria porque não envolve o confronto armado directo. Este período foi também apelidade de "equilíbrio de terror": equilíbrio porque não existe confronto bélico e o terror associado ao facto de ambas as potências possuirem armamento atómico, capaz de destruir o planeta.
Raymond Aaron define a situação durante a Guerra Fria com uma citação que se tornou famosa no decorrer da História: "Paz impossível, guerra improvável". A paz era impossível na medida em que os dois grandes blocos ideológicos mantinham ideais tão contrários que jamais haveria um entendimento mútuo; mas por outro lado, a guerra é improvável devido ao medo mútuo de utilização de armamento nuclear.
Vive-se, então, um num mundo bipolarizado entre o Ocidente, onde prevalecem os valores do Liberalismo e da economia de mercado e onde os Estados Unidos são os grandes líderes e o Leste, onde os valores do socialismo, comunismo e a economia de planeamento e a supremacia do proletariado, embora com algumas limitações à liberdade, prevalecem.
George Kennan aponta uma razão possível para a Guerra Fria. Este diplomata americano em Moscovo escreveu um artigo que enviou por telegrama para Washington e que chegou ao destinatário sem que a KGB o intercalasse. Como o assinava com um xis, ficou conhecido como "Artigo X" ou "Longo Telegrama". Nele, Kennan diz que não existe qualquer oportunidade de cooperação entre o capitalismo e o comunismo, uma vez que os sistemas são incompatíveis em todas as áreas fulcrais da vida: economia, finanças, política, cultura... Assim, só poderá haver um combate de vida ou morte entre ambos. Mesmo porque, segundo Kennan, os dois tipos de economia dos blocos ideológicos anulam-se um ao outro: a propriedade privada anula a propriedade colectiva e vice-versa. Refere que a guerra será duradoura e unirá muitos esforços a nível mundial. Fala ainda de uma União Soviética que é o prolongamento do imperialismo russo e que tudo fará para ir sempre alargando o seu território.
As explicações de Kennan são aceites pelo presidente norte-americano Harry Truman, que passa a tomar medidas para combater o avanço comunista, naquela que passa a ser conhecida como a "Doutrina Truman": uma política de contenção do avanço comunista, utilizando para isso todos os meios possíveis.
Do lado soviético, a explicação para a Guerra Fria surge por parte de um general russo e depois de toda a comunidade soviética. Este diz que a União Soviética deve estar preparada para uma guerra com os países liberais na medida em que o objectivo inicial do comunismo é sempre abater o capitalismo. Relembra Marx e o Manifesto Comunista, que apela à união mundial de todo o proletariado e que afirma que o Comunismo só pode sobreviver se o mundo inteiro for comunista. É, por isso, objectivo estabelecer uma revolução mundial global.
De uma forma ou de outra, é entendido pelas duas partes que a guerra é de vida ou morte e existe um clima de desconfiança mútua: ambos pensam que a outra parte estará pronta a atacar as suas forças a qualquer momento. Neste sentido, ambos os blocos começam a preparar a defesa e o ataque: o único factor que os trava de iniciar um conflito armado é a posse por ambos de armamento nuclear.
A nível geográfico, o bloco ocidental compreende a América do Norte, a América Latina (diversos movimentos de esquerda, como Allende no Chile ou Kubitscheck no Brasil são dizimados pelos norte-americanos), a Europa Ocidental e a Austrália. O bloco de leste compreende a União Soviética, os países satélite da Europa de Leste e mais tarde, após a revolução maoísta, a China. Existe uma zona "cinzenta" em todo o continente africano: no processo de descolonização, guerras sangrentas entre comunistas e liberais tomam conta da maior parte dos países, com cada uma das forças em causa a ser patrocinada ora pelos Estados Unidos ora pela União Soviética.
A nível militar, desde o final da II Guerra que há a assinatura de vários pactos militares. O primeiro, entre a França e o Reino Unido, em 1946, vira-se contra o possível reaparecimento da força militar alemã. Em 1948 o Benelux une-se, através do "Pacto de Bruxelas". A Europa pede ajuda aos Estados Unidos contra a ameaça nuclear e os americanos concedem armamento nuclear aos seus países europeus aliados.
A 4 de Abril de 1949 nasce o Pacto Militar do Atlântico Norte, que institui a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Inicialmente, França, Reino Unido, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Itália, Noruega, Dinamarca, Islândia, Estados Unidos, Canadá e Portugal formam um pacto militar defensivo que funciona apenas no caso de um estado membro ser atacado, ou seja, só funciona em caso de agressão externa a um estado membro. Esta noção da OTAN veio a ser alterada depois da Guerra Fria, em que passa a ter uma actuação agressiva e ofensiva.
A OTAN é constituída por duas organizações: o Conselho da OTAN é uma organização política constituída pelos ministros dos negócios estrangeiros e que reúne duas vezes por ano, podendo contar também com a presença de ministros das finanças e de chefes de estado; há depois uma Organização Militar da OTAN sob dois comandos, o do Atlântico e o da Europa. Interessante aqui referir que os Açores, território de extrema importância estratégica que motivou a entrada do Portugal fascista logo no início, como 12º membro fundador da OTAN, pertencem ao comando do Atlântico da OTAN e não à Europa. Os Açores foram desde sempre um arquipélago altamente cobiçado pelos Estados Unidos, que preparavam um golpe em 1974 caso os comunistas triunfassem após a revolução do 25 de Abril: não querendo perder esse ponto estratégico a meio caminho da Europa, os Estados Unidos tinham já organizado um falso movimento pela independência dos Açores, que seria imediatamente reconhecida por eles, à semelhança do aconteceu no Kosovo, caso o governo instalado pós-fascismo fosse comunista e por conseguinte ligado à União Soviética.
Polémicas à parte, a função da OTAN nesta altura é a de defender o mundo liberal do possível ataque comunista.
Do lado Soviético, surge em 1955 o Pacto de Varsóvia, seis anos depois da instituição da OTAN. O principal motivo que leva à criação do Pacto de Varsóvia é o rearmamento alemão: só depois dos ociedntais darem novamente armas à Alemanha é que os de leste resolvem fazer o Pacto de Varsóvia. Importa referir que em 1949 os ocidentais devolvem a soberania às três partes alemãs ocidentais: Churchill refere que o único país com força suficiente, na Europa, para combater os comunistas era a Alemanha, que representa uma fronteira contra o avanço comunista e como tal, o rearmamento neste país é feito rapidamente Em 1954 a Alemanha entra na OTAN e como reacção, a União Soviética assina o Pacto de Varsóvia.
Pela mesma altura, os Estados Unidos passam armamento nuclear para a Europa Ocidental e começa a corrida entre os dois blocos para ver quem possui maior quantidade de armamento atómico.
A nível económico, aos liberais interessa uma população rica, satisfeita, que garanta um apoio contra o comunismo e que seja capaz de apoiar as ideologias ocidentais. Para isso, é importante que a recuperação económica seja rápida e bem sucedida e como tal surge nesta altura o "Plano Marshall", do secretário de estado norte-americano George Marshall. Este plano, de 1947, diz respeito à oferta de ajuda americana para a reconstrução de todos os países que sofreram com a II Guerra Mundial. Ajuda aos ocidentais, claro. De faco, a situação da Checoslováquia, entalada no centro europeu, é paradigmática: com um governo misto de liberais e comunistas, a teoria vigente até há poucos anos era a de que Stalin tinha proibido a ajuda norte-americana ao país. No entanto, soube-se recentemente que nunca fez parte dos planos norte-americanos prestar ajuda a nenhum país de leste, como a Checoslováquia ou a Polónia.
Esta ajuda de Marshall é gratuita em 85%, maciça, crucial para a recuperação da Europa. Compreende ainda a transferência tecnologia, profissionais, de forma a que seja possível uma rápida e forte recuperação económica de toda a Europa ocidental. E aconteceu, de facto, um crescimento extraordinário, muito baseado na vontade de defender os regimes ocidentais contra o comunismo. O revés da medalha tem a ver com o facto da Europa estar agora dependente dos Estados Unidos: as empresas, materiais, tecnologia são americanas e como tal a Europa vê-se num neocolonialismo, desta vez como uma colónia com a metrópole situada na América do Norte.
A Leste, surge o Comecom, um comité de ajuda mútua organizado entre países do regime soviético através do sistema da economia de planeamento. Cada país membro dedica-se a uma actividade económica para a qual está vocacionado. Por exemplo, a Polónia maioritariamente rural produz trigo e milho, a Checoslováquia mais industrial produz automóveis, etc. Na realidade, este processo de ajuda mútua serve mais para fomentar o imperialismo russo, que se aproveita das riquezas naturais dos estados satélite que controla.
A nível político, o bloco ocidental cria organizações de defesa dos valores liberais, enquanto os soviéticos criam um comité de controlo sobre os países satélite, de forma a que não fujam à doutrina imposta do comunismo de partido único.
A nível das origens, há muitas teorias quanto ao início da Guerra Fria. Alguns autores apontam 1917, a chegada dos bolcheviques ao poder, como o início do conflito; outros falam da 2ª Guerra Mundial, outros da Batalha de Stalingrado, etc. Efectivamente, o primeiro conflito armado entre os dois blocos ideológicos acontece na Grécia.
Em 1939, Mussolini invadira a Grécia mas sem sucesso: apenas com a ajuda de Hitler os italianos conseguem empurrar os gregos e os apoiantes de Churchill para Creta, ocupando aquele país. No entanto, a Norte, perto da fronteira com a Jugoslávia, mantinha-se uma resistência comunista ao fascismo e a Sul uma resistência liberal contra os alemães. Em 1947 acontecem eleições na Grécia, onde os partidários do ocidente ganham. Essas eleições são consideradas fraudulentas pelos comunistas e instala-se uma guerra civil entre ambas as ideologias: a Norte apoia-se o comunismo e a Sul o Ocidente. Tratou-se de uma guerra dura, em que os comunistas avançavam no terreno e só depois da intervenção directa dos Estados Unidos é que são derrotados. Trata-se, contudo, da primeira batalha directa entre os dois blocos mas onde Stalin não intervem. Stalin, respeitando o acordo de Ialta, reafirma que a Grécia pertence ao domínio ocidental e como tal não existe reacção soviética nesta guerra civil.
A reacção vai existir sim aquando do chamado "Golpe de Praga". Em 1938, Hitler entrou na Checoslováquia e em 1939 a ocupação nazi era total e foi pacífica. No fim da guerra, dá-se eleições democráticas e quem ganha são os comunistas mas sem maioria absoluta. Forma-se um governo minoritário de salvação nacional e dentro desse governo estão liberais e comunistas. A morte de um elemento do governo liberal desencadeia a dúvida sobre suicídio ou assassinato por parte dos comunistas, o que leva a um clima de tensão entre as duas forças no governo. Posteriormente rompe-se o acordo entre ambos: os comunistas começam a ocupar fábricas, escolas, armazéns, levando a uma tomada violenta do poder que é considerada um golpe de estado.
Os americanos entendem também como uma violação das leis a chegada dos comunistas ao poder e acabam-se as negociações entre os dois blocos. Os laços são cortados e instala-se entre ocidente e leste uma guerra fria rígida, com um corte radical das relações entre os dois mundos.
Num clima de guerra, onde a tensão é imensa, surge também a guerra ideológica, com ambas as potências a denegrir a imagem da outra. As organizações militares estão montadas (OTAN e Varsóvia) e a nível económico os estados protegem-se (Marshal e Comecom). No Leste, a recuperação económica é extraordinária, só sendo o resultado inferior ao americano pois partem de uma situação de destruição total deixada pela II Guerra enquanto a América ficou intocada pelo conflito e, pelo contrário, ganhou até com a venda de armamento e o crédito. A União Soviética peca apenas pela falta de motivação que um regime comunista com aqueles contornos impôe naturalmente nos seus habitantes.
5.1. Noção de Guerra Fria
5.2. Inicio da Guerra Fria ("Golpe de Praga")
5.3. Formação dos blocos ideológicos, económicos e militares
Após o final da II Guerra Mundial e com a derrota do Nazismo-Fascismo em todo o mundo, começam a aumentar as diferenças entre os dois blocos ideológicos restantes e vencedores da guerra, o bloco ocidental, constituídos pelos liberais capitalistas e o bloco de leste, constituído pelos socialistas comunistas. Esta tensão entre os dois é de tal ordem que Churchill, numa conferência em Zurique, chega a falar de uma "cortina de ferro" que separa o mundo capitalista do mundo comunista, tais são as diferenças ideológicas que os separam. Trata-se, assim, do nascimento de uma situação que se prolongará até ao início dos anos 90 e que ficará conhecida para a História como o período de Guerra Fria entre o Ocidente e o Leste. Guerra porque há um corte total das relações diplomáticas entre os dois blocos e fria porque não envolve o confronto armado directo. Este período foi também apelidade de "equilíbrio de terror": equilíbrio porque não existe confronto bélico e o terror associado ao facto de ambas as potências possuirem armamento atómico, capaz de destruir o planeta.
Raymond Aaron define a situação durante a Guerra Fria com uma citação que se tornou famosa no decorrer da História: "Paz impossível, guerra improvável". A paz era impossível na medida em que os dois grandes blocos ideológicos mantinham ideais tão contrários que jamais haveria um entendimento mútuo; mas por outro lado, a guerra é improvável devido ao medo mútuo de utilização de armamento nuclear.
Vive-se, então, um num mundo bipolarizado entre o Ocidente, onde prevalecem os valores do Liberalismo e da economia de mercado e onde os Estados Unidos são os grandes líderes e o Leste, onde os valores do socialismo, comunismo e a economia de planeamento e a supremacia do proletariado, embora com algumas limitações à liberdade, prevalecem.
George Kennan aponta uma razão possível para a Guerra Fria. Este diplomata americano em Moscovo escreveu um artigo que enviou por telegrama para Washington e que chegou ao destinatário sem que a KGB o intercalasse. Como o assinava com um xis, ficou conhecido como "Artigo X" ou "Longo Telegrama". Nele, Kennan diz que não existe qualquer oportunidade de cooperação entre o capitalismo e o comunismo, uma vez que os sistemas são incompatíveis em todas as áreas fulcrais da vida: economia, finanças, política, cultura... Assim, só poderá haver um combate de vida ou morte entre ambos. Mesmo porque, segundo Kennan, os dois tipos de economia dos blocos ideológicos anulam-se um ao outro: a propriedade privada anula a propriedade colectiva e vice-versa. Refere que a guerra será duradoura e unirá muitos esforços a nível mundial. Fala ainda de uma União Soviética que é o prolongamento do imperialismo russo e que tudo fará para ir sempre alargando o seu território.
As explicações de Kennan são aceites pelo presidente norte-americano Harry Truman, que passa a tomar medidas para combater o avanço comunista, naquela que passa a ser conhecida como a "Doutrina Truman": uma política de contenção do avanço comunista, utilizando para isso todos os meios possíveis.
Do lado soviético, a explicação para a Guerra Fria surge por parte de um general russo e depois de toda a comunidade soviética. Este diz que a União Soviética deve estar preparada para uma guerra com os países liberais na medida em que o objectivo inicial do comunismo é sempre abater o capitalismo. Relembra Marx e o Manifesto Comunista, que apela à união mundial de todo o proletariado e que afirma que o Comunismo só pode sobreviver se o mundo inteiro for comunista. É, por isso, objectivo estabelecer uma revolução mundial global.
De uma forma ou de outra, é entendido pelas duas partes que a guerra é de vida ou morte e existe um clima de desconfiança mútua: ambos pensam que a outra parte estará pronta a atacar as suas forças a qualquer momento. Neste sentido, ambos os blocos começam a preparar a defesa e o ataque: o único factor que os trava de iniciar um conflito armado é a posse por ambos de armamento nuclear.
A nível geográfico, o bloco ocidental compreende a América do Norte, a América Latina (diversos movimentos de esquerda, como Allende no Chile ou Kubitscheck no Brasil são dizimados pelos norte-americanos), a Europa Ocidental e a Austrália. O bloco de leste compreende a União Soviética, os países satélite da Europa de Leste e mais tarde, após a revolução maoísta, a China. Existe uma zona "cinzenta" em todo o continente africano: no processo de descolonização, guerras sangrentas entre comunistas e liberais tomam conta da maior parte dos países, com cada uma das forças em causa a ser patrocinada ora pelos Estados Unidos ora pela União Soviética.
A nível militar, desde o final da II Guerra que há a assinatura de vários pactos militares. O primeiro, entre a França e o Reino Unido, em 1946, vira-se contra o possível reaparecimento da força militar alemã. Em 1948 o Benelux une-se, através do "Pacto de Bruxelas". A Europa pede ajuda aos Estados Unidos contra a ameaça nuclear e os americanos concedem armamento nuclear aos seus países europeus aliados.
A 4 de Abril de 1949 nasce o Pacto Militar do Atlântico Norte, que institui a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Inicialmente, França, Reino Unido, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Itália, Noruega, Dinamarca, Islândia, Estados Unidos, Canadá e Portugal formam um pacto militar defensivo que funciona apenas no caso de um estado membro ser atacado, ou seja, só funciona em caso de agressão externa a um estado membro. Esta noção da OTAN veio a ser alterada depois da Guerra Fria, em que passa a ter uma actuação agressiva e ofensiva.
A OTAN é constituída por duas organizações: o Conselho da OTAN é uma organização política constituída pelos ministros dos negócios estrangeiros e que reúne duas vezes por ano, podendo contar também com a presença de ministros das finanças e de chefes de estado; há depois uma Organização Militar da OTAN sob dois comandos, o do Atlântico e o da Europa. Interessante aqui referir que os Açores, território de extrema importância estratégica que motivou a entrada do Portugal fascista logo no início, como 12º membro fundador da OTAN, pertencem ao comando do Atlântico da OTAN e não à Europa. Os Açores foram desde sempre um arquipélago altamente cobiçado pelos Estados Unidos, que preparavam um golpe em 1974 caso os comunistas triunfassem após a revolução do 25 de Abril: não querendo perder esse ponto estratégico a meio caminho da Europa, os Estados Unidos tinham já organizado um falso movimento pela independência dos Açores, que seria imediatamente reconhecida por eles, à semelhança do aconteceu no Kosovo, caso o governo instalado pós-fascismo fosse comunista e por conseguinte ligado à União Soviética.
Polémicas à parte, a função da OTAN nesta altura é a de defender o mundo liberal do possível ataque comunista.
Do lado Soviético, surge em 1955 o Pacto de Varsóvia, seis anos depois da instituição da OTAN. O principal motivo que leva à criação do Pacto de Varsóvia é o rearmamento alemão: só depois dos ociedntais darem novamente armas à Alemanha é que os de leste resolvem fazer o Pacto de Varsóvia. Importa referir que em 1949 os ocidentais devolvem a soberania às três partes alemãs ocidentais: Churchill refere que o único país com força suficiente, na Europa, para combater os comunistas era a Alemanha, que representa uma fronteira contra o avanço comunista e como tal, o rearmamento neste país é feito rapidamente Em 1954 a Alemanha entra na OTAN e como reacção, a União Soviética assina o Pacto de Varsóvia.
Pela mesma altura, os Estados Unidos passam armamento nuclear para a Europa Ocidental e começa a corrida entre os dois blocos para ver quem possui maior quantidade de armamento atómico.
A nível económico, aos liberais interessa uma população rica, satisfeita, que garanta um apoio contra o comunismo e que seja capaz de apoiar as ideologias ocidentais. Para isso, é importante que a recuperação económica seja rápida e bem sucedida e como tal surge nesta altura o "Plano Marshall", do secretário de estado norte-americano George Marshall. Este plano, de 1947, diz respeito à oferta de ajuda americana para a reconstrução de todos os países que sofreram com a II Guerra Mundial. Ajuda aos ocidentais, claro. De faco, a situação da Checoslováquia, entalada no centro europeu, é paradigmática: com um governo misto de liberais e comunistas, a teoria vigente até há poucos anos era a de que Stalin tinha proibido a ajuda norte-americana ao país. No entanto, soube-se recentemente que nunca fez parte dos planos norte-americanos prestar ajuda a nenhum país de leste, como a Checoslováquia ou a Polónia.
Esta ajuda de Marshall é gratuita em 85%, maciça, crucial para a recuperação da Europa. Compreende ainda a transferência tecnologia, profissionais, de forma a que seja possível uma rápida e forte recuperação económica de toda a Europa ocidental. E aconteceu, de facto, um crescimento extraordinário, muito baseado na vontade de defender os regimes ocidentais contra o comunismo. O revés da medalha tem a ver com o facto da Europa estar agora dependente dos Estados Unidos: as empresas, materiais, tecnologia são americanas e como tal a Europa vê-se num neocolonialismo, desta vez como uma colónia com a metrópole situada na América do Norte.
A Leste, surge o Comecom, um comité de ajuda mútua organizado entre países do regime soviético através do sistema da economia de planeamento. Cada país membro dedica-se a uma actividade económica para a qual está vocacionado. Por exemplo, a Polónia maioritariamente rural produz trigo e milho, a Checoslováquia mais industrial produz automóveis, etc. Na realidade, este processo de ajuda mútua serve mais para fomentar o imperialismo russo, que se aproveita das riquezas naturais dos estados satélite que controla.
A nível político, o bloco ocidental cria organizações de defesa dos valores liberais, enquanto os soviéticos criam um comité de controlo sobre os países satélite, de forma a que não fujam à doutrina imposta do comunismo de partido único.
A nível das origens, há muitas teorias quanto ao início da Guerra Fria. Alguns autores apontam 1917, a chegada dos bolcheviques ao poder, como o início do conflito; outros falam da 2ª Guerra Mundial, outros da Batalha de Stalingrado, etc. Efectivamente, o primeiro conflito armado entre os dois blocos ideológicos acontece na Grécia.
Em 1939, Mussolini invadira a Grécia mas sem sucesso: apenas com a ajuda de Hitler os italianos conseguem empurrar os gregos e os apoiantes de Churchill para Creta, ocupando aquele país. No entanto, a Norte, perto da fronteira com a Jugoslávia, mantinha-se uma resistência comunista ao fascismo e a Sul uma resistência liberal contra os alemães. Em 1947 acontecem eleições na Grécia, onde os partidários do ocidente ganham. Essas eleições são consideradas fraudulentas pelos comunistas e instala-se uma guerra civil entre ambas as ideologias: a Norte apoia-se o comunismo e a Sul o Ocidente. Tratou-se de uma guerra dura, em que os comunistas avançavam no terreno e só depois da intervenção directa dos Estados Unidos é que são derrotados. Trata-se, contudo, da primeira batalha directa entre os dois blocos mas onde Stalin não intervem. Stalin, respeitando o acordo de Ialta, reafirma que a Grécia pertence ao domínio ocidental e como tal não existe reacção soviética nesta guerra civil.
A reacção vai existir sim aquando do chamado "Golpe de Praga". Em 1938, Hitler entrou na Checoslováquia e em 1939 a ocupação nazi era total e foi pacífica. No fim da guerra, dá-se eleições democráticas e quem ganha são os comunistas mas sem maioria absoluta. Forma-se um governo minoritário de salvação nacional e dentro desse governo estão liberais e comunistas. A morte de um elemento do governo liberal desencadeia a dúvida sobre suicídio ou assassinato por parte dos comunistas, o que leva a um clima de tensão entre as duas forças no governo. Posteriormente rompe-se o acordo entre ambos: os comunistas começam a ocupar fábricas, escolas, armazéns, levando a uma tomada violenta do poder que é considerada um golpe de estado.
Os americanos entendem também como uma violação das leis a chegada dos comunistas ao poder e acabam-se as negociações entre os dois blocos. Os laços são cortados e instala-se entre ocidente e leste uma guerra fria rígida, com um corte radical das relações entre os dois mundos.
Num clima de guerra, onde a tensão é imensa, surge também a guerra ideológica, com ambas as potências a denegrir a imagem da outra. As organizações militares estão montadas (OTAN e Varsóvia) e a nível económico os estados protegem-se (Marshal e Comecom). No Leste, a recuperação económica é extraordinária, só sendo o resultado inferior ao americano pois partem de uma situação de destruição total deixada pela II Guerra enquanto a América ficou intocada pelo conflito e, pelo contrário, ganhou até com a venda de armamento e o crédito. A União Soviética peca apenas pela falta de motivação que um regime comunista com aqueles contornos impôe naturalmente nos seus habitantes.
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20/10/08
Metodologias Qualitativas para as Ciências Sociais
(Resumo do primeiro texto do livro de António Esteves e José Azevedo)
Metodologias Qualitativas - Perspectivas Gerais, António Joaquim Esteves
Por estarem separadas dos restantes níveis que fazem parte da estratégia de investigação (metodológico, teórico e espistemológico), o tratamento das técnicas qualitativas e quantitativas é por vezes feito num esquema artificial.
Os modelos deterministas apontam para uma particular "configuração do real" que privilegia o princípio da totalidade e o postulado da elevação e estabilidade da realidade. A supremacia do quantitativo é atribuída na Sociologia enquanto o fenómeno social for constante e ocorrer no seio de um contexto, obedecendo a uma concepção orgânica da sociedade. Quando assim não é, o sociólogo contenta-se apenas com o estabelecimento de relações entre os fenómenos.
Hoje em dia, a sociedade requer outras construções teóricas, seja pela emergência de novo tipo de social, onde prevalecem relações sociais de carácter electivo, seja pela convivência entre o individual e o universal. Isto significa que os estudos quantitativos devem ser complementados com estudos qualitativos.
A construção caracteriza a sociedade como configuração social pois está na base da Sociologia como saber produzido a partir da interrogação do sociólogo. Os estudos qualitativos são os meios mais adequados ao estilo de produção e circulação de sentido neste tipo de assuntos sociais.
Karl Meter fala de "metodologia descendente" e "metodologia ascendente" como forma de quebrar a clivagem marcante entre o qualitativo e o quantitativo e criar assim modos mais construtivos de organização da metodologia sociológica.
Assim, as amostragens consideradas como menos rigorosas no estudo quantitativo, tornam-se indispensáveis (amostra intencional, acidental ou bola de neve). Um estudo mais intensivo do que extensivo torna inevitável um prolongado trabalho de campo, assim como a presença continuada do investigador num processo artesanal, próprio e ininterrupto, de teorização.
Os estudos quantitativos dividem a investigação sociológica em dois trabalhos distintos e separáveis: a construção e a execução. A teorização é intensa na fase inicial, implícita ou ausente na fase da recolha, intensa eimaginativa na fase de análise de dados. Nas metodologias qualitativas, ocorre o contrário.
Além disso, os esforços de investigação prendem-se com a descoberta das diversas formas tipificáveis, a invenção de mecanismos por elas responsáveis, tanto quanto a determinação da sua extensão e distribuição. Fica sempre bem marcada a ligação da teoria ao processo de observação e a sua emergência no próprio terreno.
A afirmação generalizada do contrutivismo e da construção da realidade como pressupostos básicos está também no topo do tratamento de metodologias qualitativas. No entanto, da afirmação de que tudo é contrução a esse pressuposto vai toda uma transformação que substitui um princípio heurístico por um axioma ontológico.
Algumas teorias eliminam qualquer abordagem causal ou explicativa de fenómenos. Outros evocam processos variados da construção da realidade (mental, colectivo/ objectivo, subjectivo, etc). Por outro lado, no plano ontológico, os que de tanto sublinhar a construção social acabam por esquecer a realidade consistente, a força das coisas e por outro lado os que não renunciam à existência da realidade por mais que se debata o seu significado.
Por fim, na combinação destas duas posturas (epistemológico e ontológico) ressalta-se certas "descoincidências" que tendem a unir aspectos das duas tendências. Posições fora do processo sistémico que transforma tudo em contingente.
Outro problema geral dos estudos qualitativos é o que deve o investigador resolver a propósito da compreensão dos fenómenos em estudo: o risco da parcialidade é grande e grave. O autor é sempre colocado na origem da determinação do sentido do que produz. A interpretação é um processo perigoso para a subjectividade do autor.
Há também a pergunta sobre se será o sentido produzido em resultado de outros princípios válido para sobrepor-se ao sentido do actor, em primeira pessoa. Se por um lado o processo de sentido não se pode esgotar na força que inicia esse processo, também é certo que nenhum processo de empatia do investigador pode ficar refém da sua subjectividade ou sentido. O próprio texto ou a própria obra funcionam como outro princípio de decifração do sentido. A materialidade da obra e a objectividade do texto constituem o lugar por excelência de determinação do sentido: o estruturalismo prescinde do autor e escolhe a estrutura da obra como espaço do sentido possível. Segundo Michel de Foucault, o enunciado será definido pela ligação a outros enunciados que lhe são contemporâneos e não pelo seu autor.
No que toca às relaçõe sociais, este princípio varia consoante a estrutura se forma em torno de relações normativas, de exploração ou dominação, de interesse ou dom. Em qualquer uma delas, porém, são as coordenadas objectivas das relações sociais que permitem estabelecer o sentido.
Os dois princípios de determinação do sentido (autor e obra) deixam de fora um terceiro, o do contexto de produção. A dimensão contextual (condições sociais, geograficas, históricas) em que a produção cultural se desenvolveu só podem ser deixadas de fora no processo meramente analítico.
Outro princípio de determinação do sentido de actividade humana é o público, na sua multiplicidade de espaços, tempos e competências. Mead e Escarpit apontam para o facto de que o escritor, quando produz, tem sempre presente a ideia de um público, quanto mais não seja ele próprio. Porém os públicos não aparecem apenas nesta função de interlocutor na criação cultural e acção social: eles são determinantes no significado da obra humana, à semelhança do interaccionismo simbólico. Ideia irreversível é a de que o processo de recepção é um elo incontornável no que toca à decifração e criação do significado.
Sem deixar de lado eventuais clivagens entre o autor e os públicos e entre os próprios públicos, o processo interpretativo devolve à comunicação, com todas as suas limitações, o lugar central na constituição do significado tal como na constituição da sociedade.
Hoje em dia, deve-se privilegiar a integração das vantagens de cada uma das perspectivas, de forma a obter uma metodologia de maior alcance.
Metodologias Qualitativas - Perspectivas Gerais, António Joaquim Esteves
Por estarem separadas dos restantes níveis que fazem parte da estratégia de investigação (metodológico, teórico e espistemológico), o tratamento das técnicas qualitativas e quantitativas é por vezes feito num esquema artificial.
Os modelos deterministas apontam para uma particular "configuração do real" que privilegia o princípio da totalidade e o postulado da elevação e estabilidade da realidade. A supremacia do quantitativo é atribuída na Sociologia enquanto o fenómeno social for constante e ocorrer no seio de um contexto, obedecendo a uma concepção orgânica da sociedade. Quando assim não é, o sociólogo contenta-se apenas com o estabelecimento de relações entre os fenómenos.
Hoje em dia, a sociedade requer outras construções teóricas, seja pela emergência de novo tipo de social, onde prevalecem relações sociais de carácter electivo, seja pela convivência entre o individual e o universal. Isto significa que os estudos quantitativos devem ser complementados com estudos qualitativos.
A construção caracteriza a sociedade como configuração social pois está na base da Sociologia como saber produzido a partir da interrogação do sociólogo. Os estudos qualitativos são os meios mais adequados ao estilo de produção e circulação de sentido neste tipo de assuntos sociais.
Karl Meter fala de "metodologia descendente" e "metodologia ascendente" como forma de quebrar a clivagem marcante entre o qualitativo e o quantitativo e criar assim modos mais construtivos de organização da metodologia sociológica.
Assim, as amostragens consideradas como menos rigorosas no estudo quantitativo, tornam-se indispensáveis (amostra intencional, acidental ou bola de neve). Um estudo mais intensivo do que extensivo torna inevitável um prolongado trabalho de campo, assim como a presença continuada do investigador num processo artesanal, próprio e ininterrupto, de teorização.
Os estudos quantitativos dividem a investigação sociológica em dois trabalhos distintos e separáveis: a construção e a execução. A teorização é intensa na fase inicial, implícita ou ausente na fase da recolha, intensa eimaginativa na fase de análise de dados. Nas metodologias qualitativas, ocorre o contrário.
Além disso, os esforços de investigação prendem-se com a descoberta das diversas formas tipificáveis, a invenção de mecanismos por elas responsáveis, tanto quanto a determinação da sua extensão e distribuição. Fica sempre bem marcada a ligação da teoria ao processo de observação e a sua emergência no próprio terreno.
A afirmação generalizada do contrutivismo e da construção da realidade como pressupostos básicos está também no topo do tratamento de metodologias qualitativas. No entanto, da afirmação de que tudo é contrução a esse pressuposto vai toda uma transformação que substitui um princípio heurístico por um axioma ontológico.
Algumas teorias eliminam qualquer abordagem causal ou explicativa de fenómenos. Outros evocam processos variados da construção da realidade (mental, colectivo/ objectivo, subjectivo, etc). Por outro lado, no plano ontológico, os que de tanto sublinhar a construção social acabam por esquecer a realidade consistente, a força das coisas e por outro lado os que não renunciam à existência da realidade por mais que se debata o seu significado.
Por fim, na combinação destas duas posturas (epistemológico e ontológico) ressalta-se certas "descoincidências" que tendem a unir aspectos das duas tendências. Posições fora do processo sistémico que transforma tudo em contingente.
Outro problema geral dos estudos qualitativos é o que deve o investigador resolver a propósito da compreensão dos fenómenos em estudo: o risco da parcialidade é grande e grave. O autor é sempre colocado na origem da determinação do sentido do que produz. A interpretação é um processo perigoso para a subjectividade do autor.
Há também a pergunta sobre se será o sentido produzido em resultado de outros princípios válido para sobrepor-se ao sentido do actor, em primeira pessoa. Se por um lado o processo de sentido não se pode esgotar na força que inicia esse processo, também é certo que nenhum processo de empatia do investigador pode ficar refém da sua subjectividade ou sentido. O próprio texto ou a própria obra funcionam como outro princípio de decifração do sentido. A materialidade da obra e a objectividade do texto constituem o lugar por excelência de determinação do sentido: o estruturalismo prescinde do autor e escolhe a estrutura da obra como espaço do sentido possível. Segundo Michel de Foucault, o enunciado será definido pela ligação a outros enunciados que lhe são contemporâneos e não pelo seu autor.
No que toca às relaçõe sociais, este princípio varia consoante a estrutura se forma em torno de relações normativas, de exploração ou dominação, de interesse ou dom. Em qualquer uma delas, porém, são as coordenadas objectivas das relações sociais que permitem estabelecer o sentido.
Os dois princípios de determinação do sentido (autor e obra) deixam de fora um terceiro, o do contexto de produção. A dimensão contextual (condições sociais, geograficas, históricas) em que a produção cultural se desenvolveu só podem ser deixadas de fora no processo meramente analítico.
Outro princípio de determinação do sentido de actividade humana é o público, na sua multiplicidade de espaços, tempos e competências. Mead e Escarpit apontam para o facto de que o escritor, quando produz, tem sempre presente a ideia de um público, quanto mais não seja ele próprio. Porém os públicos não aparecem apenas nesta função de interlocutor na criação cultural e acção social: eles são determinantes no significado da obra humana, à semelhança do interaccionismo simbólico. Ideia irreversível é a de que o processo de recepção é um elo incontornável no que toca à decifração e criação do significado.
Sem deixar de lado eventuais clivagens entre o autor e os públicos e entre os próprios públicos, o processo interpretativo devolve à comunicação, com todas as suas limitações, o lugar central na constituição do significado tal como na constituição da sociedade.
Hoje em dia, deve-se privilegiar a integração das vantagens de cada uma das perspectivas, de forma a obter uma metodologia de maior alcance.
17/10/08
MIC - Aula 2
SECÇÃO 1: TEORIAS E ABORDAGENS GERAIS ÀS QUESTÕES DE iNVESTIGAÇÃO.
I- Principais paradigmas.
O facto das ciências sociais lidarem com um tipo de conhecimento que rompe com os outros, os não racionais, designadamente os religiosos e tecnológicos, e, envolvendo todos estes, o senso comum, faz com que as ciências sociais sejam diferentes das ciências naturais: estudamos a realidade em que nós próprios vivemos ou que nos é estranha mas da qual temos pré-conceitos. Estes são um conjunto de elementos que nos explicam à partida uma realidade.
Assim, o método experimental é pouco utilizado nas ciências sociais. As ciências naturais têm uma realidade muito mais lata do que as ciências sociais: água é água, igual em todo o mundo. Já os indivíduos não são todos iguais, o que significa que a quantidade de variáveis, ou seja, de factores, que estão em jogo num simples pequeno grupo de quatro indivíduos que se queira colocar numa experiência, é tão grande que dificilmente isolamos os factores explicativos de um determinado processo. Cada indivíduo traz uma quantidade de factores mas nós não estamos a lidar com a pessoa em si, uma vez que somos todos antes disso, indivíduos sociais. Por exemplo, mesmo a idade constitui um factor social na medida em que implica um conjunto de características dos conjuntos etários que distinguem uns indivíduos dos outros.
O laboratório, em ciências sociais, é assim um artificialismo do descontexto juntamente com os factores que cada indivíduo traz: uns são mais parecidos do que outros, consoante os factores de diferenciação. Não é fácil, assim, reconstruir em laboratório uma situação nas ciências sociais: por exemplo no “Big Brother”, os concorrentes abstraem-se da câmara mas só em alguns comportamentos: na maior parte das vezes estão bem conscientes de que o observador está lá e interagem com ele. Não é fácil reproduzir os comportamentos da vida social.
As experiências em ciências sociais levam-nos a estudar com mais frequência, por exemplo, as projecções das realidades biopsíquicas: por exemplo, o facto de num ambiente totalmente desconhecido nos parecer que reconhecemos as feições familiares de alguém, ainda que à segunda vista essa pessoa não tenha nada de familiar. Há também as experiências do “intruso” no grupo: experiências em contexto real que são bastante complicadas do ponto de vista ético pois coloca-se um “intruso” no seio de um grupo, como uma escola ou um grupo que aguarda uma entrevista de emprego, de forma a observar lideranças, comportamentos, etc. Por fim, o observador participante: um investigador que está no seio de uma comunidade, vivendo efectivamente nela. O observador tem que viver um tempo longo e aprender a viver como os membros dessa comunidade.
O cientista social deve ter consciência de que nunca perde a sua exterioridade, facto que seria necessário para uma objectivação mais rigorosa. Por outro lado, temos a possibilidade de compreender por dentro aquilo que estudamos, porém sempre de maneira limitada: ponho-me no lugar do outro e estudo-o, mas nunca sou o outro nem nunca sei tudo sobre ele. Por isso, temos sempre que estar muito críticos à relação ambígua com a realidade que estudamos e daí a importância de um diário de campo pois factos que vemos hoje, amanhã já integramos em nós e já não vemos. Marc Augé fala precisamente que a vida é a relação permanente entre o que lembramos e o que esquecemos. O que esquecemos é o que nos fica no corpo, tornando-se natural, transformando-se em conhecimento sedimentado. Por isso mesmo, o observador sai por vezes do contexto que estuda para recuperar distância do seu objecto de estudo, para voltar a lembrar-se de factos que havia já integrado em si e por isso esquecido.
Da mesma forma que os cientistas naturais querem identificar as causas dos fenómenos, também os cientistas sociais querem explicar os fenómenos e as suas causas e razões. Propõem-se assim a explicar as realidades objectivas que condicionam determinados comportamentos, como por exemplo o suicídio.
Max Weber, no seu livro “Economia e Sociedade”, faz uma crítica às teorias marxistas, depois de aceder também aos trabalhos de Durkheim. Weber desenvolve as suas teorias defendendo que o cientista social tem que perceber que cada facto de estudo é singular sem cair, no entanto, na atomização. Os indivíduos agem e reflectem, tendo relações de poder mas não apenas no que toca às classes sociais, como defende Marx. Para Weber, as dinâmicas entre os indivíduos não são apenas motivadas por ordem económica. Os grupos distribuem e accionam o poder independentemente do poder económico: há grupos sociais, como por exemplo os alunos de uma aula, em que o poder económico não reflecte qualquer importância. Há antes um poder simbólico, cultural, que todos os indivíduos possuem. Por exemplo, quando dizem que alguém tem “cara de professor”. Por outro lado, tal como nós tecemos considerações sobre nós e os outros, também temos que compreender que os agentes percebem efectivamente os seus actos, produzindo e atribuindo-lhes sentido.
Alguns cientistas sócias são mais determinísticos e dizem, por exemplo, que se a mobilidade social não for acompanhada por outros recursos, nomeadamente culturais, esta não é reconhecida: a traição do modo de se representar ao mundo na mobilidade social é duramente criticada. Os empresários, cuja situação económica é alta, nem sempre acompanham esse crescimento económico com crescimento cultural. É no binómio entre a exterioridade e a interioridade que o cientista social tem que trabalhar. Ou seja, o paradigma qualitativo e quantitativo. O interaccionismo simbólico fala do quê que a sociedade impõe ao grupo que o transcende, a estrutura, de um ponto de vista mais singularizante. O interaccionismo é defendido também por Max Weber mas também Bourdieu diz que todos temos uma posição no mundo social, que se define por um conjunto de recursos que possuímos. Temos um determinado volume de capital inserido numa estrutura de capital, que nos permite uma representação. Temos sempre uma representação da nossa posição social e dos outros, estes últimos baseados na estrutura do capital.
A observação e o interaccionismo funcionam mais na escala das micro-estruturas: Bourdieu refere que “uma visão do mundo é sempre uma divisão do mundo.” Por outro lado, não existe singularidade sem contexto.
A ciência surge assim com vários campos de análise, compreendendo uma descrição, uma narração (restituindo dinâmicas de processos e relacionando-se com factos e acontecimentos), uma compreensão e uma explicação, que procura a reconstituição dos porquês.
A problemática das disciplinas, sempre acompanhada da lógica na investigação científica, pressupõe uma correcta definição de um problema que nos levará à formulação de hipóteses, baseadas nas teorias disponíveis, na informação disponível e também em algum trabalho de imaginação e invenção teórica. O passo seguinte é a pesquisa empírica, com a recolha e tratamento de informação e testes de validação das hipóteses teóricas, que nos conduzirá depois à produção de interpretações no sentido da resolução do problema. Daqui surge o conhecimento (eventualmente aplicável sobre os processos investigados); o desenvolvimento das teorias disponíveis (informações, corroborações, modificações); o desenvolvimento das problemáticas de referência e também o aparecimento de novos problemas científicos.
Os métodos quantitativos pressupõem uma objectivação pelo que é mensurável. Pressupõem também uma extensividade, ou seja, o estudo de grandes populações (amostra larga) e um tratamento estatístico dos dados recolhidos. Os métodos quantitativos requerem ainda a captação de uma “fotografia”, ou seja, a definição do momento em que as perguntas vão ser feitas, seja às pessoas ou aos documentos. Depois, o cientista vai agrupar, classificando de forma pertinente e de forma a que seja acessível: não se consegue trabalhar com cinco milhões de pessoas mas consegue-se trabalhar com cinco grupos etários. Após o que se vai operando vários recortes, várias variáveis e limpando tudo o resto. Por isso, é importante decidir bem a amostra.
A amostra é uma representação do nosso universo de estudo, do ponto de vista probabilístico, ligando-se aqui à representatividade estatística e do ponto de vista não probabilístico, ligando-se aqui à representatividade sociológica. Para bem definir a imagem de uma amostra, recorremos à comparação com uma modista e as suas amostras de tecidos, uns maiores para que se perceba bem o padrão, outros mais pequenos porque o padrão é todo igual. Também os métodos qualitativos têm amostras, por vezes. Por exemplo, a questão da profissionalização dos artistas com a selecção de casos para um trabalho de profundidade sobre a questão.
No que respeita à representatividade estatística, quando se diminui a margem de confiança, aumenta logicamente a margem de erro. Devo sempre saber o que vale, assim, a minha amostra e também o que falta.
Quanto à representatividade sociológica, nunca sei realmente o que falta e daí dever-se dizer “os inquiridos” e não “os portugueses”. A amostra aqui não é estatisticamente representativa, uma vez que a probabilidade é desconhecida.
A amostra probabilística pode, desta forma, ser aleatória simples, com uma tiragem sistemática, acarretando os perigos que são conhecidos neste tipo de amostra. A amostra aleatória simples funciona unicamente em populações com um grau de homogeneidade máximo e não em questões muito latas: por exemplo, posso tirar aleatoriamente um certo número de representantes de um grupo de raparigas louras, se o que eu quero estudar é os géneros de cabelo louro que há; não posso fazer o mesmo estudo quando na minha população existem louras e morenas pois posso correr o risco de só escolher aleatoriamente as morenas. Da mesma forma, não posso numa turma de alunos escolher aleatoriamente 5 alunos e fazer daí o meu estudo sobre a turma no geral.
A amostra probabilística pode ainda ser estratificada, recorrendo a estratos homogéneos da população que pretendo estudar, ou através de unidades e “cachos”, através de um conjunto de unidades vizinhas (cachos) ao nível das quais se operam subamostras. Por exemplo, a sondagem aureolar, com vários graus e multiepática.
No que respeita à amostragem não probabilística, esta pode ser acidental, correndo riscos semelhantes à amostra aleatória; intencional, recorrendo a uma tipificação da população em estudo; por quotas, com controlo dos conteúdos dessas mesmas quotas; em bola de neve, correndo o risco de ao crescer, arrastar consigo mais do que o desejado; e no local, com um carácter temporal e espacial. Aqui surge o exemplo do estudo da população que foi a um festival. Como estudá-la depois do evento, se já passou, se as pessoas não estão mais ali? Temos que decidir em função do calendário e do programa, por exemplo, distribuindo as nossas acções no tempo e no espaço.
I- Principais paradigmas.
O facto das ciências sociais lidarem com um tipo de conhecimento que rompe com os outros, os não racionais, designadamente os religiosos e tecnológicos, e, envolvendo todos estes, o senso comum, faz com que as ciências sociais sejam diferentes das ciências naturais: estudamos a realidade em que nós próprios vivemos ou que nos é estranha mas da qual temos pré-conceitos. Estes são um conjunto de elementos que nos explicam à partida uma realidade.
Assim, o método experimental é pouco utilizado nas ciências sociais. As ciências naturais têm uma realidade muito mais lata do que as ciências sociais: água é água, igual em todo o mundo. Já os indivíduos não são todos iguais, o que significa que a quantidade de variáveis, ou seja, de factores, que estão em jogo num simples pequeno grupo de quatro indivíduos que se queira colocar numa experiência, é tão grande que dificilmente isolamos os factores explicativos de um determinado processo. Cada indivíduo traz uma quantidade de factores mas nós não estamos a lidar com a pessoa em si, uma vez que somos todos antes disso, indivíduos sociais. Por exemplo, mesmo a idade constitui um factor social na medida em que implica um conjunto de características dos conjuntos etários que distinguem uns indivíduos dos outros.
O laboratório, em ciências sociais, é assim um artificialismo do descontexto juntamente com os factores que cada indivíduo traz: uns são mais parecidos do que outros, consoante os factores de diferenciação. Não é fácil, assim, reconstruir em laboratório uma situação nas ciências sociais: por exemplo no “Big Brother”, os concorrentes abstraem-se da câmara mas só em alguns comportamentos: na maior parte das vezes estão bem conscientes de que o observador está lá e interagem com ele. Não é fácil reproduzir os comportamentos da vida social.
As experiências em ciências sociais levam-nos a estudar com mais frequência, por exemplo, as projecções das realidades biopsíquicas: por exemplo, o facto de num ambiente totalmente desconhecido nos parecer que reconhecemos as feições familiares de alguém, ainda que à segunda vista essa pessoa não tenha nada de familiar. Há também as experiências do “intruso” no grupo: experiências em contexto real que são bastante complicadas do ponto de vista ético pois coloca-se um “intruso” no seio de um grupo, como uma escola ou um grupo que aguarda uma entrevista de emprego, de forma a observar lideranças, comportamentos, etc. Por fim, o observador participante: um investigador que está no seio de uma comunidade, vivendo efectivamente nela. O observador tem que viver um tempo longo e aprender a viver como os membros dessa comunidade.
O cientista social deve ter consciência de que nunca perde a sua exterioridade, facto que seria necessário para uma objectivação mais rigorosa. Por outro lado, temos a possibilidade de compreender por dentro aquilo que estudamos, porém sempre de maneira limitada: ponho-me no lugar do outro e estudo-o, mas nunca sou o outro nem nunca sei tudo sobre ele. Por isso, temos sempre que estar muito críticos à relação ambígua com a realidade que estudamos e daí a importância de um diário de campo pois factos que vemos hoje, amanhã já integramos em nós e já não vemos. Marc Augé fala precisamente que a vida é a relação permanente entre o que lembramos e o que esquecemos. O que esquecemos é o que nos fica no corpo, tornando-se natural, transformando-se em conhecimento sedimentado. Por isso mesmo, o observador sai por vezes do contexto que estuda para recuperar distância do seu objecto de estudo, para voltar a lembrar-se de factos que havia já integrado em si e por isso esquecido.
Da mesma forma que os cientistas naturais querem identificar as causas dos fenómenos, também os cientistas sociais querem explicar os fenómenos e as suas causas e razões. Propõem-se assim a explicar as realidades objectivas que condicionam determinados comportamentos, como por exemplo o suicídio.
Max Weber, no seu livro “Economia e Sociedade”, faz uma crítica às teorias marxistas, depois de aceder também aos trabalhos de Durkheim. Weber desenvolve as suas teorias defendendo que o cientista social tem que perceber que cada facto de estudo é singular sem cair, no entanto, na atomização. Os indivíduos agem e reflectem, tendo relações de poder mas não apenas no que toca às classes sociais, como defende Marx. Para Weber, as dinâmicas entre os indivíduos não são apenas motivadas por ordem económica. Os grupos distribuem e accionam o poder independentemente do poder económico: há grupos sociais, como por exemplo os alunos de uma aula, em que o poder económico não reflecte qualquer importância. Há antes um poder simbólico, cultural, que todos os indivíduos possuem. Por exemplo, quando dizem que alguém tem “cara de professor”. Por outro lado, tal como nós tecemos considerações sobre nós e os outros, também temos que compreender que os agentes percebem efectivamente os seus actos, produzindo e atribuindo-lhes sentido.
Alguns cientistas sócias são mais determinísticos e dizem, por exemplo, que se a mobilidade social não for acompanhada por outros recursos, nomeadamente culturais, esta não é reconhecida: a traição do modo de se representar ao mundo na mobilidade social é duramente criticada. Os empresários, cuja situação económica é alta, nem sempre acompanham esse crescimento económico com crescimento cultural. É no binómio entre a exterioridade e a interioridade que o cientista social tem que trabalhar. Ou seja, o paradigma qualitativo e quantitativo. O interaccionismo simbólico fala do quê que a sociedade impõe ao grupo que o transcende, a estrutura, de um ponto de vista mais singularizante. O interaccionismo é defendido também por Max Weber mas também Bourdieu diz que todos temos uma posição no mundo social, que se define por um conjunto de recursos que possuímos. Temos um determinado volume de capital inserido numa estrutura de capital, que nos permite uma representação. Temos sempre uma representação da nossa posição social e dos outros, estes últimos baseados na estrutura do capital.
A observação e o interaccionismo funcionam mais na escala das micro-estruturas: Bourdieu refere que “uma visão do mundo é sempre uma divisão do mundo.” Por outro lado, não existe singularidade sem contexto.
A ciência surge assim com vários campos de análise, compreendendo uma descrição, uma narração (restituindo dinâmicas de processos e relacionando-se com factos e acontecimentos), uma compreensão e uma explicação, que procura a reconstituição dos porquês.
A problemática das disciplinas, sempre acompanhada da lógica na investigação científica, pressupõe uma correcta definição de um problema que nos levará à formulação de hipóteses, baseadas nas teorias disponíveis, na informação disponível e também em algum trabalho de imaginação e invenção teórica. O passo seguinte é a pesquisa empírica, com a recolha e tratamento de informação e testes de validação das hipóteses teóricas, que nos conduzirá depois à produção de interpretações no sentido da resolução do problema. Daqui surge o conhecimento (eventualmente aplicável sobre os processos investigados); o desenvolvimento das teorias disponíveis (informações, corroborações, modificações); o desenvolvimento das problemáticas de referência e também o aparecimento de novos problemas científicos.
Os métodos quantitativos pressupõem uma objectivação pelo que é mensurável. Pressupõem também uma extensividade, ou seja, o estudo de grandes populações (amostra larga) e um tratamento estatístico dos dados recolhidos. Os métodos quantitativos requerem ainda a captação de uma “fotografia”, ou seja, a definição do momento em que as perguntas vão ser feitas, seja às pessoas ou aos documentos. Depois, o cientista vai agrupar, classificando de forma pertinente e de forma a que seja acessível: não se consegue trabalhar com cinco milhões de pessoas mas consegue-se trabalhar com cinco grupos etários. Após o que se vai operando vários recortes, várias variáveis e limpando tudo o resto. Por isso, é importante decidir bem a amostra.
A amostra é uma representação do nosso universo de estudo, do ponto de vista probabilístico, ligando-se aqui à representatividade estatística e do ponto de vista não probabilístico, ligando-se aqui à representatividade sociológica. Para bem definir a imagem de uma amostra, recorremos à comparação com uma modista e as suas amostras de tecidos, uns maiores para que se perceba bem o padrão, outros mais pequenos porque o padrão é todo igual. Também os métodos qualitativos têm amostras, por vezes. Por exemplo, a questão da profissionalização dos artistas com a selecção de casos para um trabalho de profundidade sobre a questão.
No que respeita à representatividade estatística, quando se diminui a margem de confiança, aumenta logicamente a margem de erro. Devo sempre saber o que vale, assim, a minha amostra e também o que falta.
Quanto à representatividade sociológica, nunca sei realmente o que falta e daí dever-se dizer “os inquiridos” e não “os portugueses”. A amostra aqui não é estatisticamente representativa, uma vez que a probabilidade é desconhecida.
A amostra probabilística pode, desta forma, ser aleatória simples, com uma tiragem sistemática, acarretando os perigos que são conhecidos neste tipo de amostra. A amostra aleatória simples funciona unicamente em populações com um grau de homogeneidade máximo e não em questões muito latas: por exemplo, posso tirar aleatoriamente um certo número de representantes de um grupo de raparigas louras, se o que eu quero estudar é os géneros de cabelo louro que há; não posso fazer o mesmo estudo quando na minha população existem louras e morenas pois posso correr o risco de só escolher aleatoriamente as morenas. Da mesma forma, não posso numa turma de alunos escolher aleatoriamente 5 alunos e fazer daí o meu estudo sobre a turma no geral.
A amostra probabilística pode ainda ser estratificada, recorrendo a estratos homogéneos da população que pretendo estudar, ou através de unidades e “cachos”, através de um conjunto de unidades vizinhas (cachos) ao nível das quais se operam subamostras. Por exemplo, a sondagem aureolar, com vários graus e multiepática.
No que respeita à amostragem não probabilística, esta pode ser acidental, correndo riscos semelhantes à amostra aleatória; intencional, recorrendo a uma tipificação da população em estudo; por quotas, com controlo dos conteúdos dessas mesmas quotas; em bola de neve, correndo o risco de ao crescer, arrastar consigo mais do que o desejado; e no local, com um carácter temporal e espacial. Aqui surge o exemplo do estudo da população que foi a um festival. Como estudá-la depois do evento, se já passou, se as pessoas não estão mais ali? Temos que decidir em função do calendário e do programa, por exemplo, distribuindo as nossas acções no tempo e no espaço.
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