I- Principais paradigmas.

Desta forma, temos primeiro que identificar o que procuramos e em função disso entender a linguagem do que nos pediram: a clareza do problema é fundamental para a investigação. Depois, há-que ter a noção do tipo de informação de que preciso para saber que tipo de elementos vou recolher. Trata-se de saber onde está a informação e de que forma, uma vez que os documentos não existem exclusivamente para nós: temos de saber como foram construídos para saber o que podemos tirar para nós e aí fazer a nossa análise secundária, sabendo para quê que os documentos nos podem servir.
Em relação aos estudos de mercado, é preciso, ao pedi-los, saber o que se quer pedir para que o resultado não saia frustrado: temos que criar uma relação de entendimento com indivíduos que não falam a mesma linguagem que nós.
Por fim, há situações em que temos nós que lidar com o sujeito e procurar a informação, perguntando directamente. Trata-se de uma relação humana e social, com emoções, pré-conceitos, empatias, etc. Por vezes as ideias estão claras mas não se consegue comunicar. Pierre Bordieu afirma mesmo que "A maldição das ciências humanas é terem que lidar com um objecto que fala". Esta frase significa que temos que lidar com indivíduos que não são iguais a nós.
Após decidida a perspectiva de abordagem ao documento, há-que catalogar a informação, produzindo dados estatísticos de análise qualitativa e quantitativa que combinarão o sentido do documento com aquilo que procuramos. Ou então, ir à procura de um dado específico e não médio, quando queremos perceber o que foge à realidade. Os dados não permitem todos o mesmo tipo de tratamento: é importante "não somar batatas com feijões a não ser que se esteja a contabilizar quantos vegetais."
Parte-se então para a interpretação dos dados, onde temos que voltar ao problema, uma vez que a informação, por vezes, diz-nos coisas que não estávamos à espera. Numa perspectiva, produzimos ciência, noutra produzimos informação válida mas não necessariamente ciência. Porém, o que quer que se faça deve ser validado cientificamente, não querendo com isto dizer que a ciência seja a melhor explicação de todas.
Durante muito tempo viveu-se na crença de que o paradigma positivista, no qual a crença de uma explicação única para determinados fenómenos apelava a um acesso absoluto à verdade, era a abordagem mais respeitada. Sabemos, porém, que a ciência não é conhecimento absoluto e que dentro da mesma ciência há interpretações diferentes, que variam consoante o lugar, o cientista ou as provas. Perguntamo-nos agora se será a ciência o melhor conhecimento que podemos construir, sendo que o valor da ciência é diferente do valor que a sociedade atribui à ciência.
No entanto, a ciência é o único conhecimento que é provado e como sabemos, cada problema tem o seu contexto e o mesmo problema pode ser perspectivado de várias maneiras: as condições mudam muito conforme as realidades que estudamos, pelo que a ciência tem que racionalizar as distâncias.
Afastamo-nos cada vez mais de Durkheim, que diz que se deve tratar os factos sociais como coisas, ou seja, as pessoas como um objecto de análise. Nada mais errado: mesmo que nos distanciemos do objecto, ele vai sempre reagir à abordagem. Devemos ser racionais, procurando manter a ideia de que o objecto é uma pessoa que reage. Esta racionalização nas ciências sociais é uma matéria muito complicada de alcançar: toda a observação em ciências sociais é uma relação social directa ou indirecta, de nós com os outros. Eu estou sempre a interpretar, pelo que o Positivismo não pode ser hoje em dia defendido, nem nas ciências naturais.
Temos então sempre uma opinião sobre tudo o que diz o cientista social, tendo a ciência uma validade interna que é geralmente mais valorizada mas que possui regras próprias. É o senso comum que faz o nosso dia-a-dia, sem o qual não existiríamos e a partir do qual seleccionamos informação. Isto vem contradizer o que diz Durkheim, que aponta para a reificação do poder científico, dando um poder social aos cientistas através de regras do método sociológico. Durkheim diz que se há uma ordem natural tem que haver uma ordem social e classifica a sociologia como uma ciência de síntese de todas as outras ciências.
Concretamente, Durkheim estuda o suicídio e classifica-o como um acto solitário cuja explicação vinha da Psiquiatria. Durkheim explica que quanto mais desenvolvido for o país onde se encontra a pessoa, maior a taxa de suicídio o que, entre outros valores estudados, o leva a concluir que o suicídio é uma doença social que depende da anomia, ou seja, o grau de integração ou desprendimento do indivíduo na sociedade. Nas sociedades mecânicas, por oposição às sociedades orgânicas, a taxa de suicídio é maior.
A ciência é um conhecimento específico, com regras, com base na razão. É um modo de ver e interpretar o mundo em que o conhecimento é construído por demarcação com outras formas de conhecimento mas onde a ruptura nunca é absoluta. A corrente científica neo-marxista aponta de novo para o conceito de classe social, embora não existam classes visíveis e separadas mas continuam a explicar estilos de vida em sociedade. As correntes de Marx não são as dominantes porque toda a interpretação de Marx é no sentido político de uma mudança de uma determinada sociedade. Marx tem a perspectiva do conflito, do poder, onde a luta é fundamental na sua perspectiva sobre a sociedade. Já outros perspectivam a mudança através de uma relação harmoniosa: a função entre os grupos sociais, o Funcionalismo.
Através das correntes funcionalistas, estuda-se como podem funcionar em harmonia as classes sociais, tentando perceber para resolver o conflito. Se o conflito marxista leva à revolução, a função leva à harmonização. Os funcionalistas defendem certos momentos, como por exemplo o Carnaval, em que a sociedade pode transgredir as normas estabelecidas. Voltando a Marx, este proclama que o proletariado deve entrar em revolução pois não existe mais capital do que força. Algumas das suas constatações, num determinado tempo, são válidas.
Em relação à dicotomia hermenêutica/ holismo, não existe neutralidade mas é bom que não se caia na total hermenêutica, que é o outro extremo, ou seja, a explicação de tudo pela fenomenologia, pelo existencialismo. As ciências sociais situam-se entre os holísticos e os paradigmas singulares hermenêuticos, caindo, como diz Bourdieu, no "senso comum doutro".
Quanto aos investigadores e cientistas, todos têm um valor social, uns mais que os outros e os que têm maior poder intimidam por isso mesmo. A observação é uma relação social de poder de saber especializado, científico. Assim, é também pela crítica holística que se defende que é preciso explicar. A ruptura com o senso comum significa precisamente que temos que estar mais atentos ao próprio senso comum com o qual rompemos. Ou seja, a estrutura enquanto conjunto de valores, normas, comportamentos e instituições da sociedade que não vemos mas que temos que perceber onde estão. A estrutura influenciando os sujeitos e as práticas e vice-versa. O cientista social deve estar atento a essa relação, ou seja, ao senso-comum.
As estruturas são assim mostradas pelos indivíduos e suas acções: "As estruturas sociais são estruturadas e estruturantes", diz-nos mais uma vez Bourdieu. A. Giddens refere ainda que "Há uma dupla estruturação das estruturas. As estruturas sociais são duais e só existem através dos sujeitos." Assim, os sujeitos são reflexivos, ou seja, exprimem as estruturas e mudam-nas.
Quanto à razão, como paradigma poderemos prestar atenção às teorias sobre o desenvolvimento. Rostow define-nos teorias etnocêntricas do desenvolvimento, modelo que serve de base ao mundo da indústria, por exemplo. No entanto, há teorias que falam da corrupção e exploração dos países em desenvolvimento, apontando-os não como atrasados mas como explorados e reprimidos. Isto significa que temos que olhar para a realidade e vesti-la conforme as suas particularidades, confrontando o conhecimento com a realidade e vendo se a realidade mudou. Os modelos não podem ser enfiados à força na sociedade.
A razão significa uma ruptura com o que parece evidente, perguntando sempre sobre o que está construído (a boa ciência está na pergunta e não na resposta) e colocando uma hipótese que esteja sempre sujeita à prova e à refutação: as hipóteses têm sempre que resistir ao seu contrário.
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