04/11/08

HMC - Aula 11

VI - TRANSIÇÃO PARA A DEMOCRACIA
6.1. Raízes da transição: três personalidades, três políticas (João Paulo II, Ronald Reagan, Mikhail Gorbatchov)
6.2. "Queda do Muro de Berlim"
6.3. Transição nos países de Leste
6.4. Fim da URSS
6.5. Reunificação alemã

O Muro de Berlim tinha sido construído durante a madrugada de um dia de Agosto de 1961. A cidade era então governada por comissões conjuntas indicadas pelos estados ocupadores. O muro foi construído na sequência da migração de leste para a parte ocidental da cidade: devido ao intenso fluxo de pessoas, Nikita fala com Ulbricht e decidem fazer um impedimento físico para que não passe ninguém de Berlim Leste para Berlim Ocidental. As versões divergem quanto ao comprimento do muro mas certo é que tinha três metros de altura e no topo arame farpado, vidro, electricidade, etc.

Trata-se de um dos muros físicos contruído para dividir famílias e daí ter ficado conhecido como "Muro da Vergonha". Outros muros fazem o mesmo que este mas não se tornaram tão famosos: em Israel, o que separa Gaza do resto do país, chamado de "Muro de Segurança", que impede os árabes de irem para território judeu. O Tribunal Internacional ordenou a demolição deste muro mas na ONU, apoiados pelos Estados Unidos, os israelitas conseguiram-no manter em pé. Outro muro, desta vez chamado de "Muro da Cooperação", é o que separa a fronteira dos EUA com o México, tentando assim impedir a emigração ilegal para solo americano.

No dia 8 de Novembro de 1989 dá-se a Queda do Muro de Berlim, com a contribuição de ambos os lados. Porquê? A URSS estava nessa altura em franco declínio: a década de 80 trouxe também problemas à Alemanha de Leste e Gorbatchov, Presidente da URSS, adoptou a "doutrina Sinatra": cada um faz o que entender e como melhor entender ("my way"). Tanto levou a cabo esta política que a Polónia é o primeiro país do Leste a abandonar o Comunismo, mesmo antes da queda do muro.

Em relação à Alemanha, o que acontece é que a Alemanha Ocidental, ao formar uma república em 1949, nunca reconheceu a Alemanha de Leste como um país mas sim como um território ocupado. Assim, tratam os de Leste como se fossem seus cidadãos e se um se dirige a uma embaixada da Alemanha Ocidental noutro país, é-lhe concedido um passaporte ocidental. Em 1989, cada vez mais cidadãos da Alemanha de Leste vão para outros estados fazer isto. A certa altura, estão em Praga, na embaixada da Alemanha Ocidental, mais de 10.000 cidadãos da Alemanha de Leste a pedir passaporte e saída do seu país. Trata-se de um país inteiro a querer fugir do seu território. Praga pergunta a Moscovo o que deveria fazer e estes demarcam-se. Para se livrarem das hordas de alemães de Leste, os checos carimbam os passaportes e mandam-nos para a Áustria.

Vive-se então uma tensão incontrolável entre as duas Alemanhas. No dia 8 de Novembro de 1989, acontece uma conferência de imprensa transmitida em directo na Alemanha de Leste pela rádio. Nessa conferência, um porta-voz do governo responde assustado à pergunta de quando irá o governo abrir as passagens para a Alemanha Ocidental: "Agora." e o povo começa a debandar para as fronteiras. Os guardas não sabem o que fazer e permitem a passagem dos cidadãos: o sistema soviético desmorona-se perante a falta de autoridade. O Ocidente recebe os alemães de Leste de braços abertos e nesse Natal, a prenda mais importante nos EUA é um pedaço do muro de Berlim.

Nesta altura há três personalidades que são a personificação de três tipos de pensamento e que contribuem em larga escala para o fim da Guerra Fria. São elas o Papa João Paulo II, Ronald Reagan e Mikail Gorbatchov.

João Paulo II nasceu na Polónia em 1920 e morreu em Roma em 2005. Em jovem era um saudável desportista que sentiu muito cedo a vocação de servir Deus. Comot al, choca com os comunistas polacos e vai para um sacerdócio clandestino, uma vez que pelo materialismo dialéctico não existe conciliação entre a Igreja e o comunismo. João Paulo II é um ferveroso anti-comunista, que luta toda a sua vida para derrubar o regime e instalar outro que seja favorável à Fé. É doutorado em Teologia e as suas teses são todas à volta do controlo da natalidade, sendo contra o uso do preservativo e demonstrando sempre posições ultra-conservadoras. É eleito Papa a 16 de Outubro de 1978, causando polémica por ser o primeiro Papa não italiano desde há 450 anos.

Como Papa, é politicamente muito activo, sempre contra o comunismo. É um bom comunicador, utiliza música para pregar a sua doutrina em concertos juntam multidões: sabe ser moderno pelo uso da tecnologia e línguas mas é conservador, defendendo uma Igreja típica do séc. XIX. João Paulo II apoia a Polónia de Lech Walesa, protagonista de um movimento católico anti-comunista. O Papa apoia este movimento com dinheiro- o Vaticano é uma das maiores empresas do mundo, com bancos, investimentos, etc. Consegue assim derrubar o comunismo na Polónia mas não se fica por aqui. João Paulo II viaja por toda a Europa de Leste, dizendo aos fieis que "não devem ter medo de amar Cristo". A sua luta pela religião significa, naquela altura, a luta contra o comunismo.

Outra das personalidades desta altura foi Ronald Reagan, que viveu entre 1911 e 2004. Vem de uma família da classe média alta americana, que insiste para que ele se forme em Direito. Porém, depois da Licenciatura, Reagan decide ouvir a sua vocação e envereda por uma carreira como actor, em Hollywood. Porém aí é um actor mediano, destacando-se antes na vida política através dos sindicatos dos actores. É um conservador extremo, perseguindo as "bruxas comunistas" com sucesso. Elege-se governador da Califórnia, que é ainda hoje o 7º ou 8º maior estado do mundo. Em 1980, é eleito Presidente dos Estados Unidos da América. É um católico declarado, ressuscitando os medos americanos de uma invasão católica idêntica à que ocorreu com a imigração europeia no início do século.

Como presidente do país, a nível interno, Reagan instaurou aquilo a que chamaram "reaganomics": uma drástica diminuição de impostos, que provocou um autêntico choque fiscal- a ideia era que os ricos investissem o dinheiro que não pagam em impostos e assim se recuperasse o orgulho nacional. Uma das frases que se ouvia nessa altura era "America is Back". Esta receita funciona no primeiro ano de mandato: Reagan diminui 33% dos impostos, o dinheiro é investido e cresce o emprego. Porém, no ano seguinte, começa a faltar dinheiro para a educação e a saúde. Reagan pede créditos e dá-se o gigante endividamento norte-americano, que perdura até hoje e que foi contrabalançado com o facto da China ter comprado a dívida externa dos EUA.

George Bush sucede a Reagan, que perde passados quatro anos para Bill Clinton por razões de ordem económica: os resultados da política de Reagan foram um imenso desastre económico e Clinton repete: "it's the economy, you stupid".

No plano externo, Reagan faz a chamada "guerra das estrelas". Quando chegou ao poder, não tinha inimigos uma vez que a URSS está com problemas económicos, enfrenta uma grave crise de insatisfação e está virada para a guerra no Afeganistão. Reagan recebeu imenso investimento da indústria do armamento e tem que fazer essa "guerra das estrelas" para justificar o dinheiro que lhe deram os empresários do armamento. Trata-se da construção de um verdadeiro escudo de defesa norte-americano, capaz de anular qualquer ataque nuclear, ao mesmo tempo que deixava o resto do mundo refém.

No exterior, Reagan é um político de pouco sucesso, que ficou conhecido como destruidor do Muro de Berlim apenas porque era ele que estava no poder. Foi um feroz anti-comunista e estava lá quando o Comunismo desapareceu ainda que não tivesse feito grande coisa para isso.

A terceira figura desta fase é Mikhail Gorbachov, nascido em 1931 e ainda vivo. Vem de uma família pobre da Rússia, estuda Direito e depois engenharia de máquinas agrícolas. Vai subindo aos poucos na hierarquia do partido comunista até se tornar secretário geral, em 1985. Então, escolhe ser Presidente da União Soviética. Gorbachov apercebe-se que a economia de planeamento e o regime em si não funcionam e como dizia Lenine, eram apenas uma fase transitória na revolução comunista. Porém, na URSS as pessoas estão fartas de esperar por um comunismo que nunca mais chega.

É então que Gorbachov muda radicalmente a atitude dos líderes russos e opta por uma política de "glasnost", ou transparência, permitindo às pessoas falarem o que pensam, numa abertura para a liberdade de expressão. Gorbachov convida as pessoas a falarem directamente, criando um socialismo de rosto humano para melhorar as condições de vida na URSS. Ao mesmo tempo, a política de "perestroika" pretende reorganizar, reconstruir, mudar o sistema soviético, num paralelo com o que pretende agora Barack Obama na sua política de "change".

Gorbachov nunca quis destruir o socialismo mas antes adoptar liberdades da economia de mercado. No entanto, abriu-se nesta altura uma "caixa de Pandora" e a URSS termina, por diversas razões que têm a ver com a podridão do sistema e de todo o regime soviético. Com a morte do sovietismo, acaba também a Guerra Fria. A transição para o Liberalismo é uma transição pacífica, sem mortes nem guerras. Calmamente se implementou o sistema multi-partidário, as eleições democráticas e as liberdades individuais. Nessa altura, na Europa de Leste, a maioria das eleições foram ganhas por anti-comunistas filósofos como Vaclav Havel ou Lech Walesa.

A nível económico, acontece a privatização do que dantes era propriedade colectiva. Essa privatização foi liderada por máfias, que pilhavam e roubavam as propriedades com a ajuda dos bancos ocidentais. Tirando na Checoslováquia, onde houve alguma razoabilidade, as máfias controlaram toda a distribuição das terras na Europa de Leste. Ainda hoje, os grupos organizados, ou seja, as máfias, estão a matar a economia de países como a Hungria, a Polónia, a Croácia, a Sérvia com a total exploração do povo. Ainda hoje pagamos e sofremos com o modelo de transição: países como a Bulgária, Roménia e a Rússia, onde numa altura apenas sete máfias controlavam as sete produções mais importantes (gás, gasolina, etc...)

Foi no entanto uma transição pacífica, à excepção da antiga Jugoslávia.

O fim da Guerra Fria acontece então com o desaparecimento da União Soviética, devido ao colapso económico e tendências separatistas no conjunto das 22 províncias que a integravam. Algumas reclamam independência, como as Repúblicas do Báltico, ao que se seguem outras. Dá-se o caos na URSS. Os generais do Exército Vermelho acham que devem evitar esse caos e em 1991 preparam um golpe de estado para repor o regime soviético. Enviam tanques para Moscovo para tomar a polícia, escolas, hospitais, etc, enquanto Gorbachov estava fora. Entretanto, aparece em cena Boris Ieltsin, um comunista eleito mas que durante o golpe de estado diz que já não é comunista e é contra o golpe. Entra em Moscovo, sobe aos tanques e convida o povo e os soldados a não lutar pelo comunismo. Assim, o povo opôe-se ao golpe de estado e neutraliza-o. Seguidamente dá-se o desmantelamento da URSS, com a Ucrânia, Bielorrússia, Cáucaso, etc, a pedir independência.

A 25 de Dezembro de 1991 Gorbachov pede a demissão do cargo de Presidente da União Soviética, que assim cessa a sua existência. Cria-se em Janeiro de 1992 a Comunidade dos Estados Independentes, formada por 14 estados da ex-URSS. Esta comunidade é criada principalmente para fazer a gestão do armamento nuclear: a Ucrânia era a 3ª potência nuclear, o Cazaquistão tinha mísseis apontados a satélites, etc. Também a decisão sobre as armas nucleares é pacífica. A URSS desaparecia assim de vez e surgia a substitui-la no panorama internacional uma Rússia em colapso económico, sem força. O território que dantes dava comida e bebida ao seu povo e ao resto do mundo tem uma queda de 70% da produção e grassa a fome no território. Na altura, Portugal envia um avião cheio de carne de porco, que ao chegar a Moscovo as autoridades verificam estar fora do prazo de validade...

Com a extinção da URSS, a potência que venceu está mais forte que nunca. Os EUA sobressaem na sua força de uma forma inimaginável- são uma hiperpotência. Nunca se viu nenhum estado na História com uma força tão grande como a dos EUA após 1992.

E na Europa, um novo gigante ganha forma. A reunificação da Alemanha acontece após eleições livres na Alemanha de Leste. Dão-se negociações entre ambas as partes para a reunificação e o acordo do ocidente "engolir" o leste é tomado sem problemas. Os responsáveis pela reunificação são os quatro vencedores da II Guerra Mundial: França e Reino Unido, ameaçados pela nova super-potência europeia e sob o governo de Miterrand e Tatcher, querem a unificação sim mas sem pressas e controlada, de forma a não alterar o seu estatuto na Europa. A ainda URSS de Gorbachov está sem força para exigir o que seja, apenas tenta negociar alguns pagamentos para o seu lado e consegue; os EUA e Bush apoiam sem restrições a unificação da Alemanha, em busca de uma futura aliada no coração da Europa.

Em Abril de 1990, reunem-se em Dublin os 12 da então CEE e discute-se o que se vai fazer com a Alemanha. Quer-se uma Alemanha Europeia ou uma Europa Alemã? A Alemanha reunificada tornar-se-á o maior estado europeu, com capacidade de dominar a CEE. Ao mesmo tempo, há uma preocupação enorme com os fundos estruturais que provinham da Alemanha Ocidental: estes seriam orientados para a reconstrução do Leste alemão.

Em Dublin, às duas da manhã, o chanceler Helmut Kohl envia champagne aos jornalistas para celebrar o acordo: a Alemanha unida permanecerá membro da OTAN, não significando assim perigo para os seus vizinhos. Os fundos estruturais continuam intocados, continuando a dirigir-se para Espanha, Portugal, Itália e Grécia. A integração da Alemanha de Leste será feita às custas da Alemanha Ocidentaç. Hoje, a Alemanha continua a partilhar o dinheiro e a sua riqueza na Europa e lidera a União Europeia, tirando o protagonismo à França e ao Reino Unido.

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